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quinta-feira, 29 de novembro de 2012

João Cândido, o Almirante Negro



O descumprimento da lei pelas nossas elites, não é novidade no país. Eles sempre fizeram as leis para serem cumpridas pelos mais pobres e desassistidos.

O marechal e presidente Deodoro da Fonseca, assinou o decreto n.º 3, de 16/11/1889, um dia após o golpe que instituiu a república, e neste decreto ele proibia castigos físicos a soldados e marinheiros, e ficava proibida expressamente o uso da chibata.

Mas até 1910, o decreto vinha sendo descumprido por oficiais da Marinha do Brasil e não eram punidos. Já o marinheiro João Cândido, que resolveu liderar um movimento pelo cumprimento da lei, e que incluía a modernização da nossa Marinha de Guerra, foi expulso da força. Lutou pela reincorporação e não o tendo conseguido, morreu pobre, abandonado e discriminado, em 1969.

João Cândido Felisberto era filho de ex-escravos e liderou a Revolta da Chibata em 22 de novembro de 1910. O comando da nossa Marinha, formado àquela época, como ainda hoje, predominantemente por oficiais vindos da elite branca e aristocrática do país, defendia o castigo físico, como forma de punição de marinheiros, quase todos negros e mestiços.

A Revolta da Chibata tinha neste tratamento retrógrado, desumano e degradante, a mistura, o caldo de cultura para a sua eclosão. Alie-se a estes fatos a viagem de João Cândido à Inglaterra onde conheceu marinheiros russos que promoveram uma revolta reivindicando melhores condições, o que pode ter lhe inspirado.

Oficiais conservadores, com fortes princípios elitistas, de origens aristocráticas, comuns na Marinha até hoje, preocuparam-se e ainda se preocupam em ligar o nome de João Cândido ao de “”fantasma da insubordinação” e da “quebra de hierarquia”.

A “insubordinação” e a “quebra de hierarquia” foi muitas vezes “construída” para acusar os “de baixo” de algo que os “de cima” também estavam cometendo, como em 1964, quando os oficiais das Forças Armadas se insubordinaram contra o Presidente da República e derrubaram o governo legitimamente eleito pelo povo.

João Cândido que defendeu a modernização da Marinha antecipou-se em pelo menos dez anos ao surgimento do movimento tenentista, que nos anos 1920-1930, defenderia a modernização das Forças Armadas. Mas os tenentes eram oficiais e brancos, foram vistos como heróis e têm no Exército homenagens anuais.

Seu nome foi imortalizado na canção popular “Almirante Negro”, tornando-o um herói negro de origem popular. Oficialmente, apenas em 2005 seu nome foi inscrito no “Livro dos Heróis da Pátria”, no Panteão da Pátria e da Liberdade Tancredo Neves, na Praça dos Três Poderes, em Brasília (DF).

Mas, João Cândido só foi realmente anistiado em 2008, sem ter sido reincorporado post mortem à Marinha. Isto mostra que sua anistia não significou qualquer direito à sua família a qualquer forma de indenização, e ele continua com a patente que tinha quando foi punido com a expulsão da corporação.

Considerando que faltam heróis negros e mestiços entre os patronos das nossas Forças Armadas, é muito triste ver como ainda temos resistências na Marinha em homenageá-lo.

Isto torna a iniciativa da Petrobrás de dar seu nome ao maior petroleiro de sua frota, ainda mais louvável.

Neste 22 de novembro de 2012, aos 102 anos da Revolta da Chibata estou levando ao deputado federal Artur Bruno (PT/CE) e ao senador José Pimentel (PT/CE) uma solicitação para que João Cândido seja reincorporado post mortem à Marinha impondo à União o pagamento dos soldos atrasados e das promoções que lhe seriam devidas, bem como a concessão de aposentadoria e pensão aos seus dependentes que a isto passarem a ter direito.

2 comentários:

fotos do doi-codi rj disse...

São estes loucos que se revoltam e fazem acontecer! João Cândido e tantos outros caudilhos não se dobram com os sinos e suas batidas do som da liberdade que nos enganam e nos ponha de joelhos...

Paulo Paiva disse...

Caro Xará
Um comentário, um tanto irrelevante. João Cândido não conheceu na Inglaterra marinheiros russos que haviam se rebelado, pelo fato de que a Revolta da Chibata aconteceu em 1910 e a Revolta dos Marinheiros Russos (Encouraçado Potemkin) só ter acontecido lem 1917.

Um abraço
Paulo Afonso Paiva