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quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Futebol no Ceará e no Brasil


Em primeiro lugar, que fique bem claro: Não gosto de futebol. Pelo menos deste futebol que se pratica atualmente, onde os jogadores ganham altíssimos salários e jogam de salto alto. Ganham fama e dinheiro, sem estarem preparados para isso, compram carrões, se envolvem em acidentes, completamente bêbados, se envolvem com drogas, com o crime organizado e com travestis em grandes farras em motéis.

Não entendo o futebol cearense. Tínhamos dois times. O resto era o resto. Somente dois tinham chances de chegar às finais, disputando o campeonato cearense. Eram o Fortaleza e o Ceará. As torcidas se digladiavam. O Fortaleza caiu para a série C e agora caiu o Ceará para a B. Não temos mais nenhum time na primeira divisão. Acabou-se o futebol cearense. O Fortaleza, se não subir rápido vai se acabar, porque o que ele fatura na série C não dá para pagar seus compromissos mensais. Pensando nisso, sempre achei que os times tinham que se ajudar. As torcidas, também. A torcida do Fortaleza deveria agora ter ajudado o Ceará para não cair. A torcida do Ceará deveria ajudar a do Fortaleza a subir. Somente com os dois times na primeira divisão, com os grandes clássicos e estádio cheio, haverá renda para sustentar os dois times. Eles não enxergam isso.

E vem aí a Copa do mundo de 2014. A Fifa está dando as ordens e o Brasil, põe a viola no saco e obedece. O Congresso Nacional pasmem, o Congresso Nacional aprovou uma alteração no Estatuto do Torcedor, lei federal, para permitir a venda de bebidas alcoólicas nos estádios, que estava proibida. Mas a Fifa quer ver todo mundo bêbado, dirigindo ao sair e matando gente por atropelamentos. O nosso congresso nacional já se submeteu à vontade da Fifa e já modificou o Estatuto do Torcedor. Lamentável. Só falta dar um três oitão para cada um, na porta do estádio.

Outra lei que nossos congressistas tiveram que mudar às pressas foi a lei que instituiu a meia passagem e a meia cultural que concede a estudantes a meia entrada em espetáculos, inclusive nos estádios. Não apenas os estudantes são beneficiados, mas também os idosos, indígenas e portadores de necessidades especiais. Todos perdem, pois depois de muita negociação a Fifa aceitou um acordo com o governo brasileiro, pelo qual em três milhões de ingressos, apenas 300 mil serão vendidos pelo preço da meia.

Romário já denunciou que 80% dos ingressos foram vendidos para um só cidadão mexicano. É o maior cambista internacional. Um cidadão japonês comprou 5% e assim todos os ingressos já foram vendidos.

Triste, lamentável, mas é verdade. A Fifa tem travado uma queda de braço com o governo brasileiro e vem ganhando todas. Resta ver quem ganharia no ranking da corrupção: Brasil ou Fifa?

terça-feira, 6 de dezembro de 2011

Sócrates e a democracia


Morreu Sócrates, um dos maiores nomes do futebol brasileiro. Ele notabilizou-se nos jogos em que defendeu o Corinthians e a Seleção Brasileira. Sócrates ficou conhecido também pelo seu estilo ético, sério e consciente. Paralelamente à carreira no futebol, ele formou-se em medicina, sendo muitas vezes chamado de Dr. Sócrates.
Como acontece com muita frequência no país, logo após sua morte, as emissoras de televisão se encarregam de endeusar, e transformar o mito em um verdadeiro santo ou herói.
Falam muito na democracia corintiana, criação dele, para mostrá-lo ao mundo como o homem que lutou pela democracia no Brasil, enfrentando a ditadura militar. Não é verdade. Vamos separar e analisar as coisas. Sócrates esteve em nosso futebol em uma época em que a disciplina nos vestiários era algo ditatorial. O jogador ficava obrigado a comparecer às concentrações, dois ou três dias antes dos jogos e ficava trancado em hotéis, com restrições de sexo, bebidas alcoólicas, e sendo obrigado a viver com horários rígidos para alimentação, para dormir e despertar.
Cheio disso que lhe atrapalhava os horários da residência médica, Sócrates usou a sua liderança para levar os demais jogadores do Corinthians a uma rebelião que ficou conhecida como a democracia corintiana. Consistiu em retirar das mãos do treinador e da diretoria o poder de mando. Os jogadores tinham que discutir as decisões. Acabaram com a concentração e outras coisas que incomodavam os atletas.
Isso foi numa época, em que fora dos clubes existia no Brasil uma ditadura militar e o povo ansiava por democracia. Chegou a época das Diretas Já. Sócrates como muitos outros atletas, cantores, artistas globais, foi convidado para ir ao palanque das diretas. Ele foi e disse algumas palavras de ordem, pedindo democracia. Inclusive foi muito infeliz quando ameaçou: - “ou mudamos o país, ou vou embora para o exterior”! As diretas não chegaram naquele ano. Atraído por um contrato milionário na Itália, e não devido a decisões de ordem política, o jogador foi para a Europa, alheio a tudo que ficava aqui, a ditadura militar, os sequestros, os desaparecimentos, as torturas, as mortes.
Democracia corintiana. Democracia no país. Confundiram tudo e hoje, em muitos blogues, Sócrates é apontado como o militante que lutou pela democracia no país. Não é verdade. Sócrates foi um grande jogador de futebol. Liderança entre seus pares levou a democracia ao Corinthians. Mas só isso. Apenas isso.

Este texto está disponível em meu videoblogue em http://www.youtube.com/watch?v=uJwBOWcTG7Q&feature=channel_video_title

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Crendices Populares


Como diz a canção da MPB vivemos em um país abençoado por Deus e bonito por natureza. Mas, também por natureza, este é um país riquíssimo em superstições. E não poderia ser diferente em um país que nasceu à sombra da miscigenação de índios, negros e brancos europeus. Nossos índios se pintavam e se adornavam com penas e miçangas coloridas. Alguns negros, vindos da região do Islã sabiam trabalhar metais e fizeram adornos de prata e ferro. A tudo isso chamaram de “balangandãs”.
Mas estes balangandãs não tinham a função apenas de enfeitar. Havia por trás, toda uma estória que os levava a crer em proteção, e que muitos acreditam e cultuam até hoje. Mexendo na caixinha de adornos da minha filha, encontrei dois destes balangandãs. Um olho grego e uma pimenta vermelha.
O olho grego é uma bolinha de vidro colorido branca, com uma circunferência menor em azul, e outra bem menor de cor preta que representa a pupila do olho. Acredita-se que ele emite energias, positivas, naturalmente. Afasta a inveja, o “olho grande” e absorve energias negativas que iriam para quem o usa. Desta forma, quando não tiver mais espaço disponível para a absorção de energias, ele se quebra.
A pimenta vermelha acredita-se que afaste todo o mal que viria para quem a usa, deixando quem o enviou com todo o ardor da pimenta em suas entranhas; além disso, a sua cor vermelha viva atrai os olhos e “puxa” toda a energia ruim que viria deste olhar.
Passaríamos todo o dia aqui escrevendo/lendo sobre este tema inesgotável. Todo mundo considera isso como crendice, meras superstições. Mas todo mundo usa alguma das crendices populares do Brasil.
Nas casas de amigos que mais pensamos que não acreditam nessas coisas, ali se vê uma ferradura atrás da porta, um comigo-ninguém-pode no jardim, uma figa na pulseira, e tantas outras coisas.
Dei um balanço na minha casa para ver quantas dessas coisas incorporei ao meu cotidiano e sem perceber vai sendo “cultuado” por aqui. Achei muita coisa. No alto da porta do meu quarto, pendurada, balançando ao sabor dos ventos, há uma bruxinha, sobre a qual já escrevi no meu blogue. Ela personifica uma lenda nórdica que diz -"Quando ele e ela, tocarem as vestes da bruxa, jamais se separarão”. Deu certo, já caminhamos para quase 25 anos de casados.
No jardim, sentado em um tronco seco de carnaubeira, está um São Francisco, obra do artista popular Diógenes, que diuturnamente protege minha casa, minha família. Eu o pedi sentado, e creio que ele deve estar feliz, pois está confortavelmente instalado sobre o tronco, sem o cansaço de outras imagens que permanecem eternamente de pé.
Tenho uma Bíblia Sagrada em um CD, obra da Editora Paulus. Foi presente de um padre, um ex-amigo, que por mais que distribua CDs com a Bíblia Sagrada pelo mundo, não diminui sua pesada carga de pecados a exigir o justo castigo.
Mas o que tenho de mais importante para afastar de minha casa os maus espíritos, é uma carranca do Rio São Francisco, que segundo historiadores, na proa das barcas, navegou por ali de 1880 a 1940 tendo sido as únicas embarcações primitivas dos povos ocidentais que utilizaram figuras de proa. No portão da minha casa, a carranca afasta os maus espíritos, os corruptos, que desaparecem sem imaginar nem o porquê. Muita gente da prefeitura deixou de andar aqui depois que coloquei a carranca no portão.
Há tudo isso e muito mais, para proteger a pessoa contra os maus fluídos. É para acreditar? Acho que não, mas é algo que deve ser preservado, pois faz parte de nossa cultura, faz parte da formação do nosso povo e deve ser passado para as futuras gerações, como um importante eco do nosso passado.

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Exploração da miséria


Trabalhando na minha varanda ouvi um barulho de carro de som, entrando em minha rua. Parecia que o carro estava parado em algum ponto próximo de minha casa.
Uma voz de homem, falando pausadamente, quase chorando apelava às pessoas para que ajudassem “essa pobre mulher com um problema na perna” sofrendo há muitos anos sem que a medicina possa dar jeito. Ela precisa da sua ajuda. Ajude com qualquer valor que Deus o abençoará. Se não tiver dinheiro pode doar um quilo de qualquer alimento, pois ela é sozinha no mundo e não pode trabalhar para prover o seu sustento.
E ele prossegue agradecendo com um muito obrigado a esta senhora que ajudou com cinco reais. Obrigado ao garoto que trouxe um quilo de café, e por aí vai. Fui até ao portão para ver o carro passar. Ao ver-me no portão ele parou o carro e apelou para os meus sentimentos solicitando que o ajudasse. Aproximei-me e vi uma senhora, aparentemente com mais de 60 anos, com uma das pernas inchada e totalmente ferida e ensangüentada. Não sei que doença ela tem.
A prática da mendicância não é mais crime no Brasil, nem contravenção penal. Mas aquele casal está explorando a boa fé das pessoas. Ela, se contribuiu para a previdência e tiver direito à aposentadoria, já tem idade de estar aposentada por tempo de serviço ou por doença, se for o caso. Se nunca contribuiu, já tem idade de estar recebendo o Benefício de Prestação Continuada – BCP, exatamente para as pessoas que chegam a esta idade e não tem o amparo da previdência.
Além de ter o direito de estar recebendo um salário mínimo, tem direito a tratamento gratuito pelo Sistema Único de Saúde – SUS e acesso a medicamentos gratuitos.
Ele continuava apelando para que eu contribuísse. Aproximei-me dele e perguntei se ela não teria direito à aposentadoria ou ao BCP. Prontifiquei-me a ir com ele ao hospital de nossa cidade para uma consulta e início do tratamento. Ele arrancou com o carro dizendo ao microfone: “Se o senhor não quer ajudar, que Deus o abençoe assim mesmo!” Claro que eles não querem tratamento. O tratamento e a cura seria como matar a galinha dos ovos de ouro.
Polícia! Onde está a polícia que não vê isso? Onde estão as assistentes sociais do Centro de Referência Especializado de Assistência Social - Creas que não vêem isso? Onde estão os conselheiros municipais do idoso que não vêem uma idosa sendo vilmente explorada? Para quem não conhece o Creas, ele é uma unidade pública e estatal, que oferta serviços especializados e continuados a famílias e indivíduos em situação de ameaça ou violação de direitos, que é o caso daquela senhora.
Eles estão frequentemente em nossa cidade. Quer vê-los? Eles aparecem na semana de pagamento dos aposentados, pagamento do Bolsa Família, pagamento dos servidores públicos. Nestas oportunidades, em que o povo incauto está com dinheiro, eles surgem para a exploração da miséria. Passam em frente à delegacia, ao Fórum, ao Creas, todos ouvem os apelos dramáticos do homem, e ninguém toma qualquer providência. E a idosa continua sendo vilmente explorada, porque ao final do dia, depois que ele conta o arrecadado e desconta o da gasolina, do desgaste de pneus, o do trabalho dele, quanto sobra para ela?
No alto, foto aleatória, captada na internete.
Este texto pode ser visto no meu VÍDEO BLOGUE FRAGMENTOS, no You Tube, em http://www.youtube.com/watch?v=egjUiTACPDw .

quinta-feira, 17 de novembro de 2011

Adoção de animais. E as crianças?


Cada dia mais comum nos noticiários da grande mídia, fatos que mostram crianças recém nascidas, abandonadas pela mãe. Há mães que fogem da maternidade deixando lá o próprio filho abandonado, que será encaminhado para uma instituição e talvez consiga adoção. Adoção difícil, nos casos de crianças negras ou portadoras de deficiências.
Para falar apenas de casos recentes, vimos mãe que descartou o filho, dentro de uma sacola de supermercado, atirando-o em um terreno, por cima do muro. Outro foi jogado no lixo, em um container, numa esquina qualquer. Crianças em sacos plásticos foram atiradas em lagoas e sobreviveram, porque o saco fechado, contendo ar, não afundou e foi encontrado por alguém. Houve uma que vendeu o filho por sessenta reais e uma cesta básica! Crianças institucionalizadas são cada vez mais comuns, e as instituições sem fiscalização, nem sempre as tratam com dignidade e respeito.
Vejo com certa preocupação os mil e um apelos nas redes sociais, para que adotemos animais de rua. Referem-se aos cães de rua, como anjinhos, que precisam de nossa proteção. Nada contra. Tenho em casa seis cães, e quatro foram “adotados” diretamente das ruas, ou da casa de amigos que iam descartá-los. Nunca vi nas mesmas redes sociais um apelo em favor de crianças de rua, para que alguém se sensibilize e adote estes anjinhos!
Ainda nas redes sociais vi um casal de São Paulo, passando final de semana no Guarujá e que encontrou próximo ao hotel duas gatas de rua, famintas e abandonadas. Compraram ração e alimentaram as bichanas enquanto permaneceram ali, e depois fizeram o apelo na rede social, para que pessoas dali, ou das proximidades, adotassem as gatinhas. Claro que viram muitas crianças de rua, abandonadas, famintas, nas portas de bares e restaurantes, mãos estendidas em um gesto desesperado, tentando saciar a fome que os mata lenta e cruelmente. Em nenhum momento vi o casal afirmar nas redes sociais que lhes deu um prato de comida. Como não vi o casal apelar para moradores do local, no sentido de encontrar-lhes um lar.
Fico muito à vontade para falar porque de 1997 ao ano 2000, fui membro do Conselho Tutelar. Preocupado com o que vi, de crianças que têm seus direitos violados constantemente, fundei o Centro de Defesa da Criança e do Adolescente, e venho lutando diuturnamente pelos direitos dos pequenos. Perdi a conta de quantos meninos e meninas retirei das ruas, para instituições ou para adoção. Fico mais à vontade ainda, para adotar cães de rua, porque não esqueci as crianças.
O ser humano deveria inspirar-se no mundo animal. Os irracionais têm outras atitudes em relação às suas crias. Uma das cadelas que adotei recentemente, a Lolita, que tem cerca de um ano, estava em um final de tarde, nesta semana, deitada sob a rede da varanda, onde eu estava deitado, concentrado, pensando no que escrever para o meu blogue nesta próxima sexta-feira. Repentinamente vi passar um bando de micos, no Nordeste chamados de soim, pulando de galho em galho nas árvores. Ao pularem de uma palha de coqueiro para outra, as mães levavam os filhotes nas costas, firmemente agarrados. Porém um destes filhotes caiu ao chão, e ela gritou desesperadamente atraindo a atenção do bando que ia mais adiante e voltou de imediato. A Lolita correu para o local e mataria o filhote de soim, é o instinto animal. Mas todo o bando desceu como um exército organizado de soins, e avançou contra a Lolita, batendo-lhe no focinho e mordendo-lhe as orelhas. Enquanto isso a mãe recolocou o filhote nas costas e subiu no coqueiro. O resto do bando instantaneamente subiu o coqueiro deixando a cadela latindo para o alto, não se dando por vencida.
E eles são os irracionais! As mulheres, seres racionais, que abandonam ou vendem os filhos, poderiam se inspirar neste bando de soins, que mostrou organização, união e, principalmente, amor à família.

Você pode ver este texto no meu vídeo blogue em http://www.youtube.com/watch?v=egjUiTACPDw .

sábado, 12 de novembro de 2011

Insegurança nas universidades


Notícias verdadeiramente preocupantes vinham chegando de todos os cantos do país, dando conta de grande insegurança nos campus universitários, que atingem alunos, professores e funcionários.
No início deste ano, para não irmos muito longe, diversas foram as notícias que chocaram o país, dando conta de estupros nos campus, nas salas e principalmente nos banheiros de faculdades públicas ou particulares.
O estupro é um crime hediondo que atingiu universitárias de norte a sul do país, em instituições públicas e privadas. As últimas tentam ainda, abafar os casos para não prejudicar suas imagens, sem nenhuma preocupação com a vítima.
Em São Paulo, tentaram assaltar um estudante para levar-lhe o carro. Como ele esboçou reação, foi assassinado, no estacionamento do campus. No Ceará, um professor teve o veículo levado do estacionamento do campus, por ladrões que o deixaram ali, completamente nu.
Em todo o Brasil, é comum o roubo de computadores e caros equipamentos de laboratórios. Câmeras de segurança filmaram e a TV exibiu o ladrão entrando sem nada e saindo com um “notebook” de uma universidade. O caso mais comum é o de sequestro relâmpago, no qual professores, funcionários e estudantes são levados ao caixa eletrônico para sacar o que puderem e depois são levados em seus próprios carros para bairro distantes onde são liberados.
Esta era a situação caótica na qual se encontravam mergulhadas nossas universidades públicas e privadas. A sociedade ouviu o grito de socorro vindo dos muitos campi de universidades estaduais e federais que pediam segurança. A Universidade de São Paulo – USP, a Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, com o maior campus do país, situado na Ilha do Fundão, a Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG, a Universidade de Brasília – UNB, a Universidade Federal do Ceará – UFC, entre outras, abriram suas portas, através de convênios, para que as polícias militares de seus estados pudessem adentrar aos campi e ali fazer o patrulhamento ostensivo, dando mais segurança à comunidade universitária.
Estatísticas oficiais comprovam que houve redução nos crimes praticados ali, e que citamos, como estupros, roubos, furtos, assaltos, sequestros relâmpagos e outros. No entanto, enquanto alunos da UFMG, da UNB, e da UFRJ apareciam em telejornais pedindo um aumento do efetivo policial militar em seus campi, para aumentar a segurança, três estudantes da USP foram presos por fumarem maconha no estacionamento. Foi o suficiente para que outros cento e cinquenta estudantes tentassem resgatar os presos, o que não conseguiram. Mas depredaram seis viaturas policiais e atiraram contra os policiais paus, pedras e um cavalete. Passaram à ocupação do prédio da Geografia, mais tarde se transferiram para o prédio da Reitoria. Nada contra a ocupação de prédios públicos. Já participei disso, de forma pacífica, sem danos ao patrimônio público para exigir reformas, aumentos de salários de professores, melhores condições de ensino, melhores equipamentos, ou fora do meio estudantil, para exigir terras para a reforma agrária, moradias para os sem teto, etc. Mas o que se viu no prédio da Reitoria foi a barbárie, cenas de depredação, para defender o uso livre da maconha no campus universitário.
Ora, a maconha é proibida no país. A Cidade Universitária, não pode ter legislação própria, diferente da cidade de São Paulo, onde está inserida. Os vândalos falam em protesto para mudar a lei e liberar a maconha, mas não é destruindo a Reitoria que se muda a legislação.
Cidadãos perplexos passaram a ver na TV, o vandalismo de um pequeno grupo de maconheiros, que não representa o pensamento dos estudantes da tradicional e respeitada USP, destruindo computadores, mesas, cadeiras, câmeras de segurança, enquanto de outro lado, o Estado demorou a tomar a decisão de cortar água, energia, internete e iniciar a reintegração de posse com a prisão de todos os vândalos, que deveria ter sido feito no primeiro minuto. Note que o estudante da foto cobre o rosto com a camisa, tal como o fazem os bandidos, porque sabe que o que está fazendo é crime. Veja o cartaz onde afirma que “os policiais são trabaliadores...”
Muitos irão me chamar agora de reacionário. A estes, que não conhecem minha história, meu desprezo. Para que eles estejam aí hoje, com plena liberdade, para me criticar e fazer o que quiserem, posso dizer simplesmente que eu VIVI 68!
O ano de 1968 foi um ano bizarro, muito louco, enigmático, que muitos que o viveram ainda não o entenderam. Zuenir Ventura explica aquele ano, em seu livro “1968, o ano que não terminou”. Estive presente nos principais acontecimentos daquele tempo e de muitos participei ativamente. Costumo dizer que estive de corpo presente, participando, contribuindo, lutando, nos acontecimentos do Rio de Janeiro, onde morava. Vi, assisti, sentindo-me participante, mas “por procuração” os acontecimentos no resto do mundo. Equipes de TV, tudo assistiam e me mostravam, como se seus jornalistas fossem meus procuradores.
Assim, vi, por procuração a “Libertação de Paris”, o “Maio Parisiense” nas barricadas, no tumulto dos sinos, nos incêndios, nos fogos de artifício. Vivi, por procuração, a "Revolução Húngara" e vivi por procuração, um momento inesquecível, o "Outubro Polaco". Vivi por procuração, ainda, a "Primavera de Praga". Foi por procuração que pude ver, me sentindo como quem participava, a alegria de “Abril em Lisboa”!
Mas foi aqui, que sem procuração nenhuma, vivi de corpo presente, enfrentando tanques e a cavalaria, na Avenida Rio Branco, os acontecimentos de 68, que marcaram para sempre, com sangue, tortura, desaparecimentos e mortes, a história do nosso país. Em 28 de março de 1968, estava na Cinelândia quando soube do assassinato de Edson Luiz, no Calabouço. Corri para lá, e voltei com a multidão que trouxe o seu corpo para ser velado na Assembléia Legislativa do Estado da Guanabara. A história guardou e reverencia seu nome. Mas com ele morreu - poucos dias depois, no hospital – o estudante Benedito Frazão Dutra. Ficaram feridos e foram atendidos no Hospital Souza Aguiar Telmo Matos Henriques, Antônio Inácio de Paulo, Walmir Gilberto Bittencourt, Olavo de Souza Nascimento e Francisco Dias Pinto. A Polícia Militar do Estado da Guanabara – PMEG, altamente despreparada, tinha como comandante da operação um aspirante, recém saído da Escola de Formação de Oficiais, o Asp. Aloísio Raposo.
Naquele tempo, sem o vandalismo e a maconha de hoje, estudantes de São Paulo se solidarizaram e quatro mil estudantes fizeram uma manifestação na Faculdade de Medicina da USP. Também foram realizadas manifestações no Centro Acadêmico XI de Agosto, da Faculdade São Francisco, na Escola Politécnica da USP e na Pontifícia Universidade Católica de São Paulo.
Em junho de 68, estive na passeata dos 100 mil, exigindo o fim da censura e lutando pela redemocratização. Em outubro, não pude ir ao 30º Congresso da UNE, em Ibiúna – SP, do qual poucos voltaram, e em dezembro assisti consternado a decretação do Ato Institucional N.º 5, o famigerado AI 5.
Agora, também consternado, assisto, por procuração, o vandalismo dos maconheiros que denigrem a história da USP. Hoje já tentam mudar o foco da ocupação e começam a dizer que a luta dos estudantes é por melhor qualidade na educação da USP. Não! Não podemos esquecer que o motivo foi a prisão de três maconheiros no campus, e que um grupo de 150 não aceitou a atuação da PM, exigindo que ela saia do campus.
Não posso esquecer que a USP, como disse acima, foi em 68 solidária às manifestações estudantis. Foi um dos principais redutos de resistência, para que hoje possamos todos nós, inclusive os rebeldes sem causa, os baderneiros da USP, viver em liberdade num estado de direito, numa democracia plena, que ajudei a construir.
Pena que uma comunidade de mais de 200 mil pessoas na USP, a maior universidade da América do Sul, seja atingida por um grupinho de baderneiros que dá este mau exemplo ao mundo. Quem ganhou com isso? Quem perdeu? Sinto que eu, como cidadão, que ajudei a construir, como ajudo a manter a USP perdi muito. Torço para que as perdas fiquem nos danos materiais, na falta de aula, no nome emporcalhado da universidade que haverá de sair dessa rapidamente porque tem história. Recuso-me a pensar que possamos vir a perder a liberdade, nossos direitos fundamentais, nossa Constituição Federal Cidadã, tudo duramente conquistado por tantos, inclusive por mim, e pela muitas turmas que passaram pela USP, antes dos atuais baderneiros que defendem o uso da maconha no campus.

segunda-feira, 7 de novembro de 2011

Enem, Christus e OAB/CE


Mais uma vez os colégios particulares, os donos de cursinhos e a mídia estão aí unidos, batendo no Enem – Exame Nacional do Ensino Médio, um dos bons frutos do Governo Lula, que ao criá-lo, tentou popularizar a educação, ou seja, colocá-la ao alcance das camadas mais pobre da população.
O Enem bateu de frente com a máfia dos cursinhos de pré-vestibular, que haviam se especializado em preparar estudantes para uma prova de múltipla escolha, onde nem era tão importante o aluno ter conteúdos. Eram cursos caros que selecionavam o estudante pela sua renda familiar.
A chegada do Enem abriu a universidade para as camadas mais pobres da população. Isso me trás de volta a uns 15 ou 20 anos atrás, quando vindo do Rio de Janeiro vim morar em Itaitinga, na Região Metropolitana de Fortaleza – CE. Contava-se nos dedos de uma das mãos, quantos estudantes de curso superior tínhamos em Itaitinga, filhos de Itaitinga, que concluíram o então 2º grau em Itaitinga, no único colégio onde se podia fazer o 2º Grau. O Colégio Valmique Sampaio de Albuquerque.
Estes poucos estudantes que chegaram à universidade pleitearam à prefeitura um transporte para trazê-los da faculdade à noite, pois era tarde e já não havia a linha regular de ônibus funcionando. O prefeito colocou uma kombi que trazia aqueles jovens. Numa Kombi, cabiam todos eles. Era a kombi que às 22 horas saia daqui levando para Fortaleza professores do 2º grau, que lá moravam, e que para não retornar vazia, trazia aqueles estudantes.
Hoje a situação é outra. Não unicamente por causa do Enem, mas o ensino melhorou como um todo. Precisa melhorar? Claro. Mas tínhamos aqui no município, professores concursados ganhando um salário mínimo. E eram felizes, por que havia municípios que pagavam metade disso ou menos e ainda atrasavam o pagamento de salários. O Governo Federal aprovou o piso salarial da categoria que está em quase três salários mínimos, ou seja, o salário do nosso professor triplicou. O Governo Federal aumentou em mais um ano o período de ensino fundamental. Muitas outras coisas vem sendo feitas ao longo dos anos, desde 2002.
Com tudo isso, e principalmente com o Enem, o estudante pobre de nossa cidade readquiriu ânimo novo, teve sua alto estima elevada e chegou com maior facilidade à universidade concretizando seus antigo sonho. Hoje se a prefeitura quiser colocar transporte para trazê-lo de Fortaleza, terá que pensar em ônibus, uma frota de ônibus! E como a educação se expandiu, nosso jovem que vai a faculdade, já não vai apenas para Fortaleza. A Universidade veio para o interior, e muitos dos nossos jovens estudam em faculdades de Horizonte, Pacatuba, e até aqui mesmo, em Itaitinga onde temos pedagogia, serviço social, educação física, administração e outros cursos.
A máfia dos cursinhos, cujos donos são os mesmos donos de grandes colégios particulares, junto com a grande mídia, estão todos com saudades dos cursinhos pré-vestibulares, que lhes proporcionavam lucros fáceis, à custa da ignorância de nossos jovens.
Estes donos de cursinhos e de grandes colégios particulares estão juntamente com a grande mídia, o PIG, lutando par por fim ao Enem. Lutam juntos por interesses comuns. A Folha de São Paulo, que já me acostumei a chamar de Falha de São Paulo, a Revista Veja, a Rede Globo, dos marinho, não reconhecem o Enem como um avanço da educação brasileira, que a democratizou, pois o Enem acaba tornando mais difícil a entrada na universidade, de menininhos ricos, da Casa Grande que agora disputam a vaga das grandes universidades com mais candidatos, os candidatos da Senzala.
Parabéns ao MEC – Ministério da Educação e Cultura que se mantém inflexível na decisão de não cancelar nacionalmente a prova do Enem, que prejudicaria mais de cinco milhões de estudantes. O vazamento da prova do Enem foi algo localizado, e olhe lá se não foi premeditado para se fazer o escândalo, em um colégio de Fortaleza. O Christus. Que se anule as provas dos 639 alunos que fizeram a prova lá.
Lamentavelmente o colégio está no Nordeste, e o que se viu nas redes sociais, foi mais agressões contra o povo nordestino, chamado no sul/sudeste de burro, e que o país deveria fazer explodir uma bomba no Nordeste. Mais uma vez vem os valdetários da OAB/CE, empunhando suas espadas flamejantes, ameaçando a população do Sul/Sudeste com processos por discriminação. E como o fez em mil e uma vezes anteriores, nada faz, se cala, e coloca a outrora respeitável e temida OAB em situação vexatória.
Para finalizar, não podemos esquecer-nos de mais duas criações do Governo Lula, o Fies – Programa de Financiamento Estudantil e o Prouni – Programa Universidade para Todos. O Fies permite que qualquer estudante pobre, com boa nota no Enem, escolha a faculdade onde deseja estudar. Mesmo as mais caras, entre as particulares. Ele busca o financiamento da Caixa Econômica Federal e paga depois de formado. O Prouni dá a ele o direito de estudar gratuitamente nas mais caras faculdades do país, pois elas se obrigam a dar bolsas para estudantes pobres. Dar, não é o termo, o governo federal paga tais bolsas, permitindo que a faculdade a abata de impostos a pagar.

quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Mais escolas e educação, com professores em greve


Hoje pela manhã, iniciei o meu dia de forma diferente, fazendo algo que nunca faço. Ao acessar a net fui direto para um site de relacionamento social. E ali estava ele, um amigo virtual, de São Paulo, professor universitário, que postara minutos antes um desabafo indignado. Uma aluna sua acabara de lhe perguntar “o que vem depois de fevereiro”. Silenciosamente, ele retirou-se da sala e foi tomar um café, esfriar a cabeça e retornou para responder. Eu teria logo dito, depois de fevereiro vem a páscoa, o dia das crianças, a festa da independência, o natal. Mas ele é paciente e respondeu direitinho.
Do outro lado, para acabar com este tipo de pergunta em sala, melhorando o nível do aluno, vemos o governo Dilma, nesta semana sancionando o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Tecnológico – Pronatec, o mais importante programa de capacitação do país. Vitória da educação e dos educadores.
De acordo com o livro “O Brasil de Lula e o de FHC”, do economista José Prata Araújo, em 1909, foi inaugurada a 1ª escola técnica profissionalizante, federal. De lá, até o final do governo FHC, ou seja, de 1909 até 2002, o país tinha 140 escolas técnicas federais. Lula, em oito anos fez mais 214 novas escolas. Dilma continua, muitas estão em obras hoje, e até o próximo ano o país terá 600.
Mas há problemas paralelos a serem resolvidos. A presidenta está abrindo concurso público para o preenchimento de 77 mil vagas para fazer funcionar tanta escola técnica. É geração de emprego e renda, melhorando a educação no Brasil. O problema é que há muito professor e poucos educadores. A qualidade do ensino é sofrível em muitos lugares. Para crescer a rede de ensino temos que melhorar o nível da educação, que melhora quando melhorarmos o nível do professor. O país dá condições, para quem quer estudar e melhorar seu nível. Formados, poucos querem.
Vejamos as greves. No estado professores entram em greve por melhor salário, mesmo havendo um piso nacional, que eles alegam não ser cumprido. Se não é cumprido, no lugar de greve o sindicato deveria propor uma ação junto ao Ministério Público. Se os professores ganham a ação, recebem o piso, se perdem, não podem fazer greve.
Mas na greve do estado, houve um ponto positivo. A união da categoria, sempre presente nas ruas, nas escolas, em assembléias. Mas e a greve dos professores federais? Os caras largaram a universidade e os institutos federais e viajaram com as famílias para curtir Buenos Aires, ou foram cuidar de seus mestrados. Alunos perderam o semestre, pois não será possível a reposição de 90 dias parados, dentro do mesmo semestre. Chamo isso de irresponsabilidade.

Na foto acima vemos a fachada do IFET-CE
O texto desta postagem pode ser visto no vídeo blog FRAGMENTOS, em http://www.youtube.com/watch?v=wGMaHm1W9mo

sábado, 22 de outubro de 2011

Carrancas do São Francisco


Segundo os historiadores, as barcas que circulavam pelo rio São Francisco de 1880 a 1940, foram as únicas embarcações primitivas de povos ocidentais que usaram figuras de proa ou carrancas. Elas serviam para espantar os animais, maus espíritos e os duendes moradores do rio São Francisco que de noite saiam das profundezas das águas para assombrar barqueiros, tentar mulheres e roubar crianças. Esses seres ao verem as figuras das carrancas nas proas, de olhos esbugalhados, de bocas enormes escancaradas e agressivas, se espantavam e se recolhiam aos seus esconderijos.
Segundo sabem os moradores de Itaitinga, eu sou o único cidadão desta cidade que tem uma carranca na porta de casa. Ela serve para espantar políticos corruptos e sem moral, nem sempre moradores da cidade, que de dia ou de noite saem das profundezas de suas consciências para assombrar o povo incauto, superfaturar licitações, participar de mensalinhos, agredir mulheres, e espancar crianças. Esses seres imundos ao se depararem com a carranca na minha porta, param, botam a mão no bolso, coçam a cabeça e vão embora desolados, para esconderem-se nas profundezas de seus fétidos gabinetes.
Quando coloquei a carranca na minha porta, percebi de imediato que determinados políticos que eram até meus amigos, eu nada sabia deles, e vinham aqui frequentemente, deixaram de vir. Depois, começaram a surgir escândalos e agradeci à minha carranca por ter tomado conta da minha casa.
Quando saio, levo no bolso um dente de alho. Também protege contra vampiros sugadores de dinheiro público. Protege contra os demônios da corrupção e as satânicas fofoqueiras, que orbitam em torno deles. É eficaz e utilizado desde a idade média.
As eleições se aproximam. Cuidado, eleitor, com o corrupto que vai tentar lhe enganar e comprar seu voto. Cuidado com o parlamentar que lhe traiu trocando de partido. Admito que um parlamentar troque de partido quando ele era perseguido no partido onde estava e não lhe davam espaço. Ou quando sai para partido novo que representa o que ele queria. Mas mudar por conveniência pessoal é uma forma de corrupção.
Imagine o quadro: eu escolho um candidato de um partido progressista (PT, PC do B, PSB) que apóia o casamento entre pessoas do mesmo sexo; apóia o aborto. Não casei com pessoa do mesmo sexo e eu e a minha mulher não admitimos em nossa família o aborto. Mas acho que a legislação deve prever isso para quem o queira. Repentinamente este parlamentar, eleito, muda para um partido de direita, conservador, como o PSC que não admite tais coisas, e vem fazendo campanha contra isto na TV. Perdi o meu voto. Fui traído pelo corrupto.
A fidelidade partidária não tem que ser garantida apenas pela lei, mas pelo eleitor que deve deixar de votar nos políticos corruptos que trocam de partido sem motivação.

sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Minorias discriminadas


Em 1994 dediquei-me à defesa de crianças e adolescentes explorados no trabalho infantil de pedreiras e cerâmicas, onde um menino de seis anos ganhou notoriedade internacional com sua fotografia, sentado, quebrando pedras. Em 1997 criei o até hoje atuante Centro de Defesa da Criança e do Adolescente de Itaitinga – Cedeca/Itaitinga, e elegi-me para o Conselho Tutelar de Itaitinga. Conseguimos extinguir esta forma de trabalho infantil, embora saibamos que haja outras, muitas outras.
Mas a discriminação social é grande. É grande a discriminação de gênero, racial e sexual. Tenho sempre abertas as portas da minha casa para as pessoas que sofrem discriminações. Acolho e encaminho.
Nossa sociedade discrimina os pobres, pessoas que moram na periferia e que são tratadas como inferiores, até nas igrejas. A mulher, que não é minoria, é discriminada em todo o Ceará de forma absurda, até nas letras de forrós, que paradoxalmente elas tanto curtem, quando são chamadas de cachorras, raparigas e outros termos. A Lei Maria da Penha não diminuiu as discriminações e elas continuam apanhando de homens no meio da rua, como aconteceu no Clube da Tia, onde no dia 9 de outubro no meio de uma festa, um vereador agrediu sua ex-mulher dentro do clube e arrastou-a até a rua onde a largou em frente a uma viatura policial que nada fez para prender o agressor em flagrante.
Quando elegemos em 2004 um prefeito negro, que está no poder até hoje (reeleito) achei que a discriminação contra negros havia diminuído no município. Mas desde a campanha a oposição o chamava de urubu, e ele, talvez por medo de perder votos, perdeu a excelente oportunidade de levar dois ou três para a delegacia pelo crime de discriminação racial. Em 2006 eu trouxe a Itaitinga um grupo de Maracatu, do meu amigo Carlos Veneranda, negro e vice-prefeito de Fortaleza, que com ele apresentou-se na Praça para meia dúzia de pessoas, não dispostas a assistir espetáculos de negro. Nem o prefeito, negro e convidado prestigiou a exibição, no Dia Nacional da Consciência Negra. Neste dia, elegemos dois delegados que foram à Brasília para um evento que debateu políticas públicas para negros, mas o município não tomou conhecimento.
A discriminação sexual é alta. Jovens de ambos os sexos são expulso de casa, no início da adolescência quando revelam suas preferências homossexuais. No ano passado, 2010, ajudei a organizar uma associação denominada Movimento Aquarela de Itaitinga, que pretende defender o público LGBTT (Lésbicas, gays, bi-sexuais, transexuais e travestis) de todas as formas de discriminação. Para tentar ganhar a simpatia da população organizamos a I Parada da Diversidade Sexual de Itaitinga, que foi um estrondoso sucesso.
Já em 2011, com apoio do Governo Federal fizemos em 22 de setembro a Mostra Itinerante do 4º For Rainbow, um Festival de Cinema e Cultura da Diversidade Sexual, que celebra a cultura de paz e o respeito à diversidade humana. Reunimos em meu sítio um grupo do público LGBTT e exibimos dez curtas que foram amplamente debatidos.
Realizamos também em 1º de outubro a II Parada pela Diversidade Sexual de Itaitinga, outro sucesso, com apoio do Governo do Estado do Ceará.
Na Mostra Itinerante do 4º For Rainbow, havia uma maleta com vários brindes, camisa do movimento, chaveiros e outros para sorteio e distribuição. Fiquei com um chaveirinho (foto acima) que resume bem as quatro formas de discriminação que evidenciei. O chaveiro fala por si. Vemos aí duas mulheres, como dissemos visivelmente discriminadas por serem mulheres. São discriminadas por serem pobres, nota-se pela maneira de se vestirem. Uma é negra, outro fator que discrimina. E... Namoram, são lésbicas, imperdoável em nossa sociedade.
Olhando para o chaveiro tenho pena da negra, até porque ela é mulher, negra, lésbica e pobre. Reúne em si, pelo menos quatro fatores que atraem a discriminação da sociedade. Até quando?
VOCÊ TAMBÉM PODE VER ESTA POSTAGEM EM MEU VIDEO BLOG FRAGMENTOS: http://www.youtube.com/watch?v=1MY-lDCQ2h0

domingo, 16 de outubro de 2011

Itaitinga, a dança dos partidos

Com a proximidade das eleições municipais os partidos políticos de Itaitinga sofreram grandes modificações. É que a maioria dos nossos políticos sem compromissos partidários continuam mudando de partido como quem muda de camisa, apesar da lei que impõe a fidelidade partidária, submetendo à cassação do mandato o político que mudar de partido. A exceção é para aqueles que mudarem para partido novo, que acabou de se formar. Com as mudanças, vejam como está a câmara municipal, por exemplo:

Alonso Bessa, presidente da Câmara Municipal, mudou do PSB para o PPL (partido novo) – Partido Pátria Livre;

Antônio Pereira do Amaral, do PMDB, mudou para o mesmo PPL;

Auricélio Nunes, do PRB, mudou para o PT;

José Nilson de Lima Santos, do PRB, mudou para o PSB;

Roberto de Lima Monteiro (Betim Girão) do PSDB, mudou para o PSD.

Em situação delicada está o vereador João Roberto de Oliveira Martins, do PP, um partido que está na área de influência de Lourival Tavares e Mauro (seu presidente), ambos de oposição. No entanto, o vereador, em seus pronunciamentos na câmara ainda não decidiu se está com os Tavares ou com o prefeito Abdias Patrício. Na última sessão, o vereador chegou a afirmar que só decidirá de que lado está, em maio de 2012.

Também em situação delicada está o vereador Francisco Alves da Silva (Tico) do situacionista PDT. Tico licenciou-se do mandato para assumir o cargo de secretário municipal de infraestrutura e em seu lugar assumiu a suplente de vereadora do PDT, Neuba Braga. Ocorre que durante a licença do titular (Tico), o partido saiu da base situacionista e foi para as mãos da oposição, ao que se diz em alguns círculos, por articulação da vereadora Neuba e do Dep. Federal André Figueiredo. O fato pode comprometer a reeeleição do vereador Tico.

Não houve alterações com apenas dois vereadores: Antônio Mauro de Freitas Guimarães do PP e Erivanda Nogueira Souza Serpa do PR. Mauro Guimarães afirma que está tranquilo, trabalhando pela sua reeleição. Já a vereadora Erivanda envolvida em boatos de que estaria deixando a vida política e se dedicando à família e à sua carreira no serviço social, nada quis declarar.

Mas não foi só na Câmara Municipal de Itaitinga que houve esta grande mudança de partidos. No executivo, o vice-prefeito Abel Cercelino Rangel Junior, também deixou o PRB pelo novo PPL – Partido Pátria Livre.

Na foto acima vemos a vereadora Erivanda presidindo a Sessão Especial do Dia Internacional da Mulher, em 8 de março de 2011.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Reforma Política: para economizar o dinheiro público


Já falei em reduzir o número de parlamentares federais, estaduais e municipais, pela metade. Deveria, se não houver maracutaia, reduzir a despesa em 50%.

Mas precisamos reduzir também o número de órgãos públicos. Por exemplo, temos um Ministério da Pesca, um do Desenvolvimento Agrário e outro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento. Ora, temos o da Pesca e dois da Agricultura. Para que? Se fizéssemos um só teríamos pesca, agricultura, abastecimento e pecuária, tudo em um ministério só. Dois ministérios seriam dissolvidos, com visível economia. Em inúmeros outros poderíamos fazer a mesma coisa, e dos atuais 37 ministérios, isso mesmo, 37, passaríamos a apenas 12 ou 15, que dariam conta do recado. E mais, se não houver Ministério da Pesca, que estaria embutido no da Agricultura, não poderia haver nos estados e municípios secretarias da pesca, que deveriam estar embutidas nas secretarias de agricultura.

Para aumentarmos a economia, deveríamos por fim às mordomias nos três poderes, nas três esferas. Acabar com cartões corporativos, verbas de representação, auxílio moradia, auxílio paletó. Ora, o parlamentar ganha o que ganha, e ainda recebe ajuda financeira para a compra de roupa e o pagamento de aluguel, quando não tem imóvel da casa. E os outros trabalhadores, não têm tais benefícios.

Os parlamentares têm recesso no mês de julho, dezembro e janeiro. Três meses de férias, porquê? Deveria ser um só, como também no Judiciário.

Com tudo isso, a maioria, isso mesmo, a maioria ainda desvia dinheiro público. Para quem desvia dinheiro público, o processo deveria ser na justiça comum, com tramitação rápida. Cadeia para os corruptos.
Finalmente, você sabe quantos servidores tem o Congresso Nacional? Vinte mil! Metade são parentes de parlamentares, de juízes e outros apaniguados. Estudos já mostraram que com sete mil o Congresso funcionaria bem, é quase um terço.

Funcionários contratados deveria ser coisa proibida nos três poderes, nas três esferas de governo. Funcionário, só por concurso público. Mas estamos perdendo tempo. Qual o parlamentar que aprovará tais sugestões?

domingo, 26 de junho de 2011

Reforma Política: Reduzir o número de parlamentares


Essa é uma proposta que não tem perigo de ser aprovada. Qual o vereador, deputado estadual ou federal, e qual o senador que teria a coragem de aprovar um projeto que ele acha que dificultaria sua eleição?

Mas a proposta é simples, clara, objetiva. Por que temos 3 senadores por estado, seja um estado grande ou pequeno? Se não se quer fazer no senado a proporcionalidade do número de vagas com a população, que se diminua o número de parlamentares. Hoje são 3 por estado, com um total de 81 senadores. Reduzir para dois por estado, com um total de 54 senadores já seria uma boa idéia.

Mas e o suplente de Senador? Temos que acabar com isso. O suplente de deputado é o mais votado que não entrou no número de vagas. Mas o suplente de senador são dois ou três nomes que ele coloca na inscrição, geralmente seu pai, esposa, filho, e que o eleitor nem toma conhecimento. Você elege o senador e o suplente, que não foi votado, vai à reboque.

A Câmara Federal, mantém a proporcionalidade entre o número de vagas e a população do estado. Mantenhamos isto, mas cortando pela metade. Por que 513 deputados federais? A metade resolveria, com menor despesa.

Nos estados, as Assembléias Legislativas tem um número de vagas proporcional ao número de habitantes do estado. Cá, no Ceará, são 46 deputados, quando apenas 23 resolveriam o problema cortando despesas pela metade.

No município é que a coisa é mais grave. Em cada um as suas particularidades. Em minha cidade, Itaitinga, no Ceará eram 13 vereadores e foram reduzidos para 9 por medida de economia. Não se economizou nada, pois os vereadores pegaram o dinheiro que sobrou das quatro vagas que deixaram de existir e se concederam um autoaumento. Agora, argumentam que com mais cadeiras fica mais fácil se eleger e voltaremos a ter 13 vagas.

É proibida a eleição do analfabeto, mas tal como Tiririca que foi eleito deputado federal, muitos vereadores nos municípios brasileiros, são completamente analfabetos. Se a missão dos parlamentares é fazer as leis do país, do estado e do município, como permitir parlamentar analfabeto?

sexta-feira, 24 de junho de 2011

Reforma Política: o voto do analfabeto


As propostas de reformas políticas estão sendo discutidas no Congresso Nacional. Serão aprovadas aquelas que beneficiarem os parlamentares federais das duas casas. Bom que o povo pudesse ser ouvido em referendum.

Eu já tenho idéia formada para algumas das propostas. Para outras, teria que pensar mais um pouco. Por exemplo: o voto facultativo. Contra ou a favor? Difícil responder agora. O voto facultativo parece mais democrático, mais civilizado. No entanto, em um país onde se compra muito voto, o facultativo seria bem mais caro, pois o eleitor esperaria em casa a melhor proposta. Há um lado positivo. O voto seria tão caro, que talvez fossem comprados menos votos.

E o voto do analfabeto? Este sou radicalmente contra. Como pode votar uma pessoa incapaz de ler as propostas do candidato e do seu partido? Tenho dois exemplos que reforçam minha teoria. Uma amiga, analfabeta funcional, candidatou-se a vereadora em minha cidade, pelo PC do B. Ela tem cinquenta e poucos anos e é beata fervorosa, vive na igreja. Quando eu lhe disse que seu partido repudia a idéia de Deus, prega o ateísmo, defende o casamento entre pessoas do mesmo sexo e defende o aborto, ela não quis acreditar e continuou em campanha afirmando sou do PC do B, graças a Deus. O Outro é um amigo que palmeirense convicto filiou-se ao PV – Partido Verde, em homenagem ao verdão!

quinta-feira, 23 de junho de 2011

As muitas fogueiras e quadrilhas de São João


Quando chega o mês de junho, as comunidades nordestinas se alvoroçam para os preparativos do São João. E, dizemos São João, como se olvidássemos, injustamente a seriedade de São Pedro, o porteiro do paraíso celeste, o guardião do grande portal; como se esquecêssemos ainda, o popular Santo Antônio, o casamenteiro, santo padroeiro de tantas moças casamenteiras, que os guardam ou os enterram de cabeça para baixo, libertando-os apenas quando o santo lhes arruma um bom partido. E, que bom partido aqui, não seja confundido com os mil e um partidos que nos enganam e perturbam neste ano eleitoral, com promessas mirabolantes que jamais poderão ser cumpridas.
Mas falemos dos folguedos juninos, que tomam conta de nossas ruas, alegrando crianças e trazendo recordações e nostalgia aos mais velhos. O nordeste explode em festas, festivais, onde o povo dança, canta, sorri, em meio à comidas típicas como o bom e substancioso baião de dois, ao som de forró e baião, no fole que rasga as quentes noites sertanejas.
Praças abandonadas pela municipalidade são limpas e preparadas pela comunidade, e ali, com um som fanhoso, pouca luz em gambiarras mal feitas, o som do fole invade a escuridão, já meio assustada pela luz quente e amarelada das fogueiras que lançam suas labaredas enfurecidas aos céus.

Aos poucos, à pé ou na carroceria de caminhões, vão chegando as crianças, os adolescentes, os jovens, com suas roupas típicas, já profanadas pelo modismo imposto pela mídia. Estão orgulhosos, a roupa nova, o aplauso e o carinho do povo, não são coisas disponíveis nos outros dias do ano.

A um canto, as quadrilhas se arrumam, com noivos, rainhas, princesas, casais destaque, mascotes, quase prontos para iniciar seu show, suas homenagens, a dança, o casamento caipira; noutro canto, perto da fogueira, meio às escondidas, sempre negadas, pululam as experiências pagãs, as simpatias, para cobrar do santo velhas promessas, para renová-las, ou para agradecer a graça do casamento arranjado.
Próximo à mesa dos jurados, em local de destaque, há mesas reservadas para as autoridades. Vereadores e candidatos antecipadamente declarados, gente que nunca se faz presente a este tipo de evento, ali está, para marcar presença, afinal este é um ano eleitoral. E, na fogueira de São João, queimam as vaidades, a vergonha, a ética, os devaneios, as verbas públicas mal utilizadas, a merenda escolar, o dinheiro do FUNDEF, como deveriam queimar mandatos e pretensões impopulares, junto com a arrogância da investidura em cargos públicos.
O sanfoneiro puxa o fole, os fogos riscam o espaço e explodem assustando a muitos com os estampidos secos. Nunca se sabe se há vereadores armados! As quadrilhas, com o apoio de candidatos e vereadores, dançam. Boa idéia seria botar os vereadores para dançar. Sei que alguns dançarão nas eleições. Mas digo agora. Nas festas juninas. Não seria interessante vermos dançar a quadrilha dos vereadores?? Uma quadrilha que se auto apoiaria, quadrilha rica, quadrilha institucional, quadrilha organizada. Fica a idéia, para que eles votem e aprovem o projeto de lei que definirá quem será o noivo, a rainha a princesa. Sem esquecer de reservar gorda fatia do orçamento público para uso próprio em ocasião tão especial. O pai da noiva furioso e armado, já sabemos quem será... E os jurados? O juiz? Gente com compromissos e que lhes dará o primeiro lugar. Afinal...
Que este povo sofrido, faminto, desempregado e sem esperanças, que cultua seus santos com tantas fogueiras, Santo Antônio, São João, São Pedro, aprenda a festejar com uma fogueira maior o dia de Santo Expedito, o padroeiro das causas impossíveis. Que ore a este santo, em busca de um futuro melhor, com políticos comprometidos com as causas sociais, para que nosso povo possa estar em festa consigo mesmo durante todo o ano. E é tão simples! Faça desta eleição uma festa. A urna será a sua fogueira. Queime nela aquilo que você sabe que não presta. Depois, festejemos com alegria esta vitória popular. Mas não esqueça de agradecer ao santo!

Conheça a origem das FOGUEIRAS DE SÃO JOÃO

quarta-feira, 22 de junho de 2011

Referendum pelo desarmamento. De novo?


Que venha o novo referendum pelo desarmamento, inspirado na tragédia da escola de Realengo no Rio de Janeiro. Votarei NÃO, como da vez anterior, e continuarei votando NÃO nas próximas vezes em que voltarem a repetir o mesmo referendum.
Mas por que, podem perguntar alguns. Simples, eu diria, o rapaz que causou a tragédia de Realengo e muitos outros bandidos em nosso país compram armas clandestinamente, por baixo preço, das mãos de policiais civis e militares. A do psicopata de Realengo custou-lhe R$ 250,00. Se o bandido tem muito dinheiro, importa a arma dos EUA ou do Paraguai.
Se eu me sentir ameaçado pela bandidagem e mal protegido pela polícia e quiser uma arma, a estória é diferente. Uma boa pistola, custa no comércio entre 3 a 6 mil reais. O porte de arma na Polícia Federal tem taxas de cerca de mil reais agora e igual valor anualmente, para sua renovação. Mas ainda tenho que fazer um curso de tiro, com 40 horas/aula que custa mais que os mil reais da taxa anterior. Tenho que pagar sessões com uma psicóloga credenciada, para fornecer-me um laudo declarando que não sou psicopata e posso ter a arma. Portanto com cerca de seis a dez mil reais, posso ter uma arma, legalmente.
Por um preço absurdo desse, para que proibir? O preço já a torna proibida. Volto a dizer, um trabalhador, não pode ter a arma, devido ao alto preço, mas o bandido a compra baratinho.
Precisamos que o governo revogue urgente as leis que protegem bandidos. O cara é condenado a 30 anos e cumpre 5, sendo libertado por “bom comportamento”. Ao sair, reincide. Os bandidos precisam ser desarmados, presos em cadeias de onde não se possa fugir, onde não se possa ter acesso a celular e drogas, e mais do que tudo, precisam cumprir a pena toda, independente de bom comportamento, pois ter bom comportamento na cadeia, é obrigação dele.

segunda-feira, 20 de junho de 2011

Brizola, o engenheiro da democracia


É a vida. Uns chegando outros partindo. Felizes dos que partem com as malas cheias de muitas bagagens, das mil e uma realizações positivas que conseguiu produzir.

Comecei a conhecer a vida pública de Leonel de Moura Brizola (RS, 22/01/1922 – RJ, 21/06/2004), quando comecei a me interessar pela política nacional. Foi em 1961, na renúncia de Jânio Quadros. Para mim, a manchete da Última Hora: Jânio Renunciou, era o prenúncio do caos! Ficara com o coração apertado como se algo ruim estivesse para acontecer a todos nós, inclusive a mim, naqueles dias.
Acompanhei sua luta pela legalidade, pelo estado democrático de direito, para garantir a posse de João Goulart na presidência da república. Acompanhei sua coragem, querendo liderar a resistência militar quando Jango foi posteriormente deposto pelo golpe militar de 1964.
Veio para nós, a longa noite da ditadura militar. Prisões ilegais, desaparecimentos, tortura institucionalizada, assassinatos e a expulsão, o desterro de cidadãos pelo simples fato de pensarem diferente. Para ele o exílio, a cassação dos direitos políticos. Toda sua memória, seus feitos, sua luta por democracia e liberdade, foram banidos do país, junto com ele. Os abutres que dominaram o país e o submeteram àquela lúgubre ditadura, impediam que se falasse nele, e nos demais que com ele estavam exilados.
Foram vinte e um anos de escuridão. Mas a sociedade derrubou a ditadura. Lentamente, minando-a aqui, ali. Muitos foram mortos. Outros carregam ainda hoje os traumas, as marcas físicas e psicológicas da tortura. Mas finalmente, raiou novamente sobre nós o sol da liberdade, com seus raios fúlgidos. Passei a ver todos os dias, na televisão, as imagens de grandes líderes que retornavam com muita emoção ao país. Festa nos aeroportos. Milhares de pessoas iam recebê-los. Eu, a tudo assistia de casa.
Até que anunciaram o retorno de Leonel Brizola, que desembarcaria no Rio de Janeiro, no Aeroporto Internacional do Galeão, hoje Tom Jobim, pois Galeão é a Base Aérea, de triste memória. Algo me empurrava para o aeroporto. Fui lá. Multidão. Imprensa, povo, faixas, cartazes, flores, lenços vermelhos, choro e risos se misturavam no ar. Ví de longe, mesmo quando ele adentrou o saguão do aeroporto e misturou-se com o povo distribuindo e recebendo abraços.

Fui embora com um sentimento bom. Tinha a certeza que o país iria mudar, caminhando democraticamente por caminhos mais justos e igualitários. Sabia das dificuldades. O país estava quebrado. Talvez cinquenta anos fossem preciso para levantá-lo, mas a chegada de Leonel Brizola, com tantos outros nomes expressivos, seria a solução.
Digo tudo isso com emoção, porque sinto que estive presente, toquei as páginas da história, fiz parte dela, ajudei, à meu modo a escrevê-la. Nunca fui seguidor de Brizola, jamais votei nele ou me filiei ao seu partido. Aliás votei nele para vice-presidente quando ele disputou na chapa com o Lula. Mas reverencio sua memória, pelo grande brasileiro que foi. Amante da democracia, da liberdade. Sessenta anos dedicado à vida pública e morreu pobre, porque sempre honrou seus compromissos e os cargos públicos que lhe confiaram.

Na primeira eleição, após a ditadura ele era candidato ao governo do estado do Rio de Janeiro. Eu estava construindo o PT, recém fundado. Tínhamos nosso candidato, Fernando Gabeira, outro brasileiro e exilado ilustre. As urnas mostraram a vitória de Brizola, que no fundo me deixou feliz. Foi uma revolução no Rio de Janeiro. Dignidade e cidadania, coisas esquecidas, após a ditadura, voltaram a fazer parte do vocabulário popular. As polícias tiveram que ser reeducadas, para encarar o povo como cidadão, não mais como subversivos em potencial. Os morros fizeram festa, ainda não dominados pelo narcotráfico.

Vim conhecê-lo após ter deixado o governo. Fui levar uma encomenda ao apartamento de uma pessoa, amiga de minha família, na Av. Atlântica. Já vinha descendo, no elevador, quando este pára em determinado andar, e nele entra, sozinho, camisa esporte, paletó folgado, sobrancelhas marcantes, Leonel Brizola. Talvez, percebendo minha surpresa, abraça-me e fala comigo como se nos conhecêssemos desde crianças. No térreo aguardavam-no dois seguranças que o seguiram até o carro.
Mas para mim, a maior revolução foi na área da educação. O secretário de educação foi Darci Ribeiro, outro grande nome de brasileiro ilustre, exilado. Outro que tinha muito a contribuir ao país, mas que ficou vinte anos fora, impedido de participar do crescimento do seu país. Muita gente lembra de Darci Ribeiro como o construtor do sambódromo. Grande idéia que misturou arquibancadas do samba e escola pública. Mas para mim, foi a construção do CIEP a sua maior obra. Obra interrompida pelo final do mandato de Leonel Brizola. Outros governos que vieram depois, não continuaram a construção de novos CIEPs, como estava previsto. Se todas as escolas públicas deste país, como pensavam Darci Ribeiro e Leonel Brizola, tivessem se transformado em um CIEP, a nossa história hoje, seria outra.
O CIEP previa educação de qualidade, em tempo integral, professores com bons salários, alimentação para todos e lar, isso mesmo, moradia no local, com mães sociais, uma família, para meninos e meninas de rua.

Hoje, as homenagens fúnebres. Poucas, por mais que se faça, para quem merece muito mais. Homenagens que tomam conta do Brasil inteiro, principalmente Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Brasília. Muitas homenagens estão chegando do exterior. O reconhecimento do mundo, àquele que fez sua parte.
No entanto, a homenagem mais justa, seria chegar amanhã ao Rio de Janeiro, e ver um CIEP, um Brizolão, com o seu nome: Governador Leonel de Moura Brizola. Seria o reconhecimento, o atrevimento, a coragem da comunidade escolar, usando a cidadania que ele tanto pregou, para render-lhe esta derradeira, singela e justa homenagem. Quem se atreve a começar?

domingo, 12 de junho de 2011

Santo Antônio casamenteiro


Santo Antônio de Lisboa, Santo Antônio de Pádua, ou simplesmente Santo Antônio, é tudo uma pessoa só. Na realidade, nem Antônio ele se chamava, mas Fernando de Bulhões. Fernando trocou de nome aos 25 anos, saindo de um convento agostiniano para um franciscano. Na Ordem Franciscana, conviveu com São Francisco de Assis, o próprio fundador da ordem. Antônio formou-se em direito.

Mas o que importa mesmo é o seu lado casamenteiro e de excelente conciliador de casais.

Antigamente havia imagens dele, com o menino Jesus ao colo, em que a imagem de Jesus não era colada ao corpo de Santo Antônio. Contam que muitas moças querendo casar, sequestravam-lhe o menino Jesus e o escondiam, só o devolvendo quando o santo lhes arrumava casamento.

Outras jovens colocam a imagem de cabeça para baixo, dizem que só a mudariam de posição quando Santo António lhes arranjasse marido. Aliás foi isso que fez minha cunhada. Pior, enterrou o santo de cabeça para baixo numa touceira de bananeiras, numa madrugada do dia 13 de Junho. O santo lhe arrumou rápido um casamento em Brasília. Não com algum deputado ou senador. Acho que o santo estava meio zangado, e arrumou um casamento qualquer. Foi mal.

No Rio de janeiro fui ver de perto um outro antigo costume. A igreja do santo, no Largo da Carioca, distribui no dia 13 de junho o pão de Santo Antônio. Ganhei um e segui a tradição: colocar o pãozinho dentro de uma lata de mantimentos, para que não falte comida durante o ano. O pão que ficou na minha casa uma ano, dentro da lata do arroz, não mofou, mantendo-se íntegro o ano todo. Não faltou comida, ou pelo milagre do santo, ou porque eu trabalhava feito um doido.

Mas o mais interessante, vi no Ceará. Já praticado em Barbalha, vi acontecer em Itaitinga. A Caminhada do Pau da Bandeira. Corta-se na mata uma árvore grande e de tronco grosso (crime ambiental). São necessários dezenas de homens para levar o pau, que servirá de mastro da bandeira do santo. No caminho, pelas ruas da cidade, eles param para pequenos descansos. Nestas paradas, olham em volta e se veem alguma moça solteira a levam para montar no pau da bandeira, que levantam e balançam. Está feito o “batizado”. Dizem que a moça casa antes da próxima festa do santo.

Presenciei uma professora que sentou no pau, da bandeira, claro. Um comerciante incrédulo disse que se ela conseguisse casamento antes da próxima festa ele daria o fogão como presente. Se vai dar, não sei, mas ela arranjou marido, já estão noivos. Se você está solteira, não custa tentar. No ano que vem, claro, pois a foto acima é da 2ª caminhada do Pau da Bandeira de Santo Antônio, em 1º de junho de 2011

terça-feira, 7 de junho de 2011

A menina queimada do Vietnã: Kim Phuc


Acho que todos lembram a história desta garotinha que foi fotografada toda queimada, correndo nua e desesperada pelas ruas de Trang Bang, Vietnã, momentos depois de um bombardeio aéreo estadunidense. Quem não lembra, não viveu aquela época, mas ouviu falar ou viu a foto da garotinha queimada, correndo em busca de ajuda.
À época eu tinha 24 anos, já era casado, sem filhos, morava em Copacabana, Rio de janeiro e fiquei chocado quando vi o vídeo na TV e a foto nos jornais do dia seguinte. A menina desapareceu da mídia e eu nem sabia se estava viva ou morta. Muitos anos depois soube que estava morando no Canadá, completamente reabilitada.
E não só eu, pouca gente sabe o nome e o destino dessa pequena sofredora que se tornou uma mulher pacifista, símbolo de luta e garra. Kim Phuc é o nome da menina que conseguiu sobreviver a esta covardia daqueles que já haviam arrasado Hiroshima e Nagasaki e que ainda arrasariam depois do Vietnam, o Iraque, Egito, Irã, e tantos outros países e povos, exterminando liberdades, banalizando a vida, desrespeitando direitos humanos.
Kim Phuc sobreviveu, embora tenha praticamente morado 14 meses em um hospital para reabilitação, para tratar a dor e sofrimento das queimaduras de terceiro grau que teve em mais da metade de seu pequeno corpo. Kim Phuc agora é uma cidadã canadense e compartilha a sua opinião sobre a sobrevivência e inspiração. Ela tem viajado por todo o mundo, reunindo e conversando com as pessoas sobre a paz. Hoje, 39 anos depois, Kim Phuc é Embaixadora da Boa Vontade das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura (UNESCO).
Na foto vemos Kim Phuc hoje, ao lado de sua foto daquela época, nua, fugindo de seu povoado que estava sofrendo um bombardeio de napalm. Até hoje a foto é lembrada como uma das mais terríveis imagens da Guerra do Vietnã.
A foto foi tirada em 8 de junho de 1972, pelo fotógrafo Nick Ut, e Kim tinha apenas 9 anos. Ali, ela não sabia que o fato e a foto mudariam a sua vida para sempre.
Apesar de todo o seu trabalho pela paz mindial, fica a pergunta: - Quando os senhores no Norte deixarão o mundo em paz?
Vejam o que Kim Phuc disse em uma entrevista à BBC:
- “Em 1972, os americanos lançaram uma bomba de napalm em meu povoado, no sul do Vietnã. Um fotógrafo, Nick Ut, tirou uma foto minha fugindo do fogo, a foto que hoje é tão famosa. Eu me lembro que tinha 9 anos, era apenas uma menina. Naquela noite, nós do povoado havíamos ouvido que os vietcongues estavam vindo e que eles queriam usar a vila como base.
Então, quando já era dia, eles vieram e iniciaram os combates no povoado. Nós estávamos muito assustados. Eu me lembro que minha família decidiu procurar abrigo em um templo, porque nós acreditávamos que lá era um lugar sagrado. Nós acreditávamos que, se nos escondêssemos lá, estaríamos a salvo.
Eu não cheguei a ver a explosão da bomba de napalm; só me lembro que, de repente, eu vi o fogo me cercando. De repente, minhas roupas todas pegaram fogo, e eu sentia as chamas queimando meu corpo, especialmente meu braço.
Naquele momento, passou pela minha cabeça que eu ficaria feia por causa das queimaduras, que eu não ia mais ser uma criança como as outras.
Eu estava apavorada, porque de repente não vi mais ninguém perto de mim, só fogo e fumaça. Eu estava chorando e, milagrosamente, ao correr meus pés não ficaram queimados. Só sei que eu comecei a correr, correr e correr. Meus pais não conseguiriam escapar do fogo, então eles decidiram voltar para o templo e continuar abrigados por lá. Minha tia e dois de meus primos morreram.
Um deles tinha 3 anos e o outro só 9 meses, eram dois bebês. Então, eu atravessei o fogo.
O fotógrafo Nick Ut nos levou para um hospital das redondezas.
Assim que ele nos deixou lá, foi para uma sala escura revelar as fotos.
Depois, me falaram que eu e as outras pessoas feridas seriam transferidas para o hospital de Saigon. Dois dias depois, meus pais me encontraram no hospital. Eu passei bastante tempo no hospital: 14 meses. Os médicos fizeram 17 cirurgias para curar as queimaduras de primeiro grau. Metade do meu corpo ficou queimado.
Aquele foi um momento decisivo na minha vida. A partir daí, eu comecei a sonhar em como ajudar outras pessoas. Meus pais guardaram a foto, que tinha saído num jornal, e depois a mostraram para mim. "Esta é você, quando você estava ferida", disseram eles. Eu não consegui acreditar que era eu, era uma foto aterrorizante.
Eu acho que todas as pessoas deveriam ver essa foto, mesmo hoje.
Porque essa foto mostra claramente como uma guerra é terrível para as crianças. Você pode ver o terror no meu rosto. Basta ver a foto, para as pessoas aprenderem”.

quinta-feira, 2 de junho de 2011

Para que título?


Sei como está se sentindo, meu amor. Tudo passa. Você e eu passaremos também e o horror do mundo permanecerá. Mas pense que, enquanto ainda estivermos lutando, bloquearemos o horror por algum tempo. Se todos abandonassem a luta, os barbaros dominariam tudo por mais milo anos. Ainda que sejamos ignorantes e mal orientados, a causa que defendemos é boa. Ttem de acreditar nisso, nunca deve se esquecer disso. Olhe... Até eu, sou um pequeno triunfo para você. Por favor, ouça-me. Não posso lembrar-me do tempo em que pertenci a mim mesmo. Agora é diferente e eu sei que me pertenço. Até mesmo se eu me der a você, dar-me-ei como um homem livre. Se você não tivesse se importado, eu estaria morto ou preso.
Tudo isto é muito bom - este lugar, este dia - não acha? Não estaríamos gozando nada disto, se você não tivesse feito a sua luta, com os seus erros também...
Agora, por que não me convida para a sua casa, para ficarmos juntos esta noite?

Rio de janeiro, RJ, 15/10/1989

segunda-feira, 30 de maio de 2011

Acordando


Saítes tão de mansinho que nem percebi. Fiquei só, é hora de ir também. Ir e não voltar.

Rio de Janeiro, RJ, 1989.

domingo, 29 de maio de 2011

Temporal


O sol apagou a sua luz. Nas trevas do dia que se fez noite, o vento açoitava a vida. Folhas se erguiam, em um violento farfalhar, na espiral do vento, e se elevavam ao céu. A chuva parecia iminente, temporal que lavaria o mundo.
O vento dobrava árvores, gritava, rugia assustando os homens. A chuva não veio, foi levada pelo vento, que levou meu coração.

Rio de janeiro, RJ, 31/01/1988.

quarta-feira, 25 de maio de 2011

Intrusa


Chegaste, sem medo, tão perto. Teus olhinhos me fitavam tão intensamente. Não sabias, mas como me perturbavas!
Displicentemente acendi o cigarro, e tu ali, parada. Queimei-te o nariz, correste, bem feito!

Rio de janeiro, RJ, 31/01/1988

segunda-feira, 23 de maio de 2011

PARA VOCÊ, que disse que não viria


Sei que mesmo tendo dito que não, você virá logo após terminar a novela Tieta do Agreste. Talvez eu esteja dormindo, docemente embriagado ao sentir no travesseiro teu cheiro de amor.
Não importa, você deitará seu corpo frio e molhado da chuva ao lado do meu; talvez eu abra os olhos, mas não estarei sentindo ou vendo. Mas tenha certeza, no meu mais profundo sono, meu coração baterá mais feliz com sua doce presença.
Boa noite!

Recreio dos Bandeirantes, Rio de janeiro, 31/10/1989
Este foi o texto de um bilhetinho deixado sobre a mesa de cabeceira, antes de dormir. No outro dia, vi que ela veio. Nos demais dias percebi que veio para ficar, e ficou até hoje... Que bom.

domingo, 22 de maio de 2011

Bruxa


Diz a lenda: -"Quando ele e ela, tocarem as vestes da bruxa, jamais se separarão".
Aí está a "minha bruxinha" para que a toques. Eu, como já a toquei! Parece que só eu a toquei.
Quando te ofereço essa bruxinha espero que entendas tudo o que quero dizer. Espero que compreendas tudo o que a timidez não me deixa dizer.
E, assim, a lenda se tornará viva, para os que como eu, não conseguem dizer tudo o que sentem. E para os que como tu, dizem, mas sabem que em amor, nunca se diz tudo.
Enfim, eu não desejava hoje, dizer-te nada. Queria só te dar a bruxa, e é o suficiente, quando as palavras são poucas e o amor é muito.

Rio de janeiro, RJ 24/05/1982.

sábado, 21 de maio de 2011

Só para relembrar. E é o suficiente!


Lembras do jardim? E daqueles lençóis quentes? Será que ainda lembras dos banhos? Banhos que eu "temperava"... E a touca improvisada com o plástico das toalhas, para não molhar o cabelo, lembras?
Lembras do ar condicionado? Lembras do barulho e do frio que ele fazia? E o carro? Aquele que não subia, lembras? Vexame, nem de ré ele ia, e o largamos na estrada...
E os bolos? Um no restaurante do Museu de Arte Moderna, e foi teu. Mas houve o meu, no dia da Olimpíada da empresa.
Lembras dos telefonemas, os recados? Coisa arriscada! Mas compensava só pelo prazer de te ver, te ouvir, te possuir, misturar tudo dentro de ti.
Lembras quando chorando pedistes: - "Aconteça o que acontecer, voce jura que não me deixa?"
- Jurei. Mas e aí? Tu me deixastes...
Mas, e aí? Lembras de nossas músicas? E os encontros no lugar de sempre, à hora de sempre, para o programa de sempre? E sabes que ainda hoje, sempre que posso, ainda volto lá?
- E para quê?
- Para nada, dirás.
- E por que volto?
- Por nada, e é o suficiente!
- Bruxa!
- Monstro! Louco!
- Ah! Tu...
- Amor!...
- ... e me deixastes!
Mas tudo bem. E aí? Vamos relembrar. Lembras dos bilhetes? Os presentes? E teu telegrama apaixonado que dizia: "te amo!"
Ah! E os cartões? Foram eles! É foi um deles, um cartão com uma rosa amarela. Rosa do meu jardim interior. Meu jardim da vida, para ti. Acharam-no! Como tudo complicou, lembra?
E aí, bruxinha? Acabou o jardim, acabou você, acabou minha vida. Será que foi o suficiente?

Rio de Janeiro, RJ, 24/05/1980

sexta-feira, 20 de maio de 2011

Poema para uma menina morta que recolhe assinaturas


Sou eu quem bate à tua porta.
Golpeio em todas as portas.
Não me podeis enxergar:
É impossível ver-se uma menina morta!

Morri fazem vinte e três anos,
Em Hiroshima.
Sou uma menina de sete anos,
As crianças mortas não crescem.

Primeiro incendiaram-se os meus cabelos,
Minhas mãos e olhos arderam depois,
Converti-me num punhado de cinzas
E meu sangue misturou-se ao vento.

Para mim, já nada vos peço,
Carinho, já não me podeis dar;
Menina que ardeu como folha de papel,
E já nem pode mastigar bombons
Eu golpeio e golpeio a tua porta:
- Faze-me a graça de uma assinatura
Para que as crianças não sejam assassinadas
E possam comer bombons.

Rio de janeiro, 1966.

Foto aleatória após o bombardeio estadunidense em Hiroshima.

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Ana, minha vida


Eu te conheci no mar! E o teu nome é Ana! Mar e Ana. Vamos ter Mariana... Se inverter o nome vai dar: Ana Maria, que por acaso é tua irmã... Ana Maria ou Maria Ana, só dá uma coisa: MARIANA.
Eu te conheci no mar, teu nome é Ana, então MAR + ANA = MARIANA. Ele já veio em 91, é Pedro Paulo. Agora é ela, Mariana. E se for homem? Então escolha o nome. Desde que escolhas Pedro Afonso! Tá bom?
Se nascer Pedro Afonso, vou amá-lo, mas prometa-me que voce vai me dar MARIANA!!!

Bilhete de 05/05/94. Mariana chegou pouco depois, em 04/06/94

Mar e Ana

O mar
ri da beleza
de Ana.
Ana
ri
da solidão
do mar.

Recreio dos Bandeirantes, RJ, 1991, nossa 1ª gravidez.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Língua portuguesa


Tenho andado há muito tempo preocupado com as agressões sofridas pela nossa língua portuguesa. Não bastassem nossos compatriotas que saem da faculdade “iscrevendo” meio torto, ainda vem hoje a Rede Globo dar uma notícia interessante. A maior colônia estrangeira em Portugal é a Colônia Brasileira. Em virtude disto, a própria Rede Globo resolveu promover lá um DIA DO BRASIL, grande festa, com artistas brasileiros, milhares de compatriotas embandeirados nas ruas. Mas a este ato, a Globo chamou de BRAZIL DAY, pode? Olavo Bilac deve estar se contorcendo na tumba, ele, logo ele, autor do soneto Língua Portuguesa, que reproduzo abaixo.

Para escorregarmos e cometermos certos deslizes, ou para evitá-los, se estudarmos direitinho, há nova preocupação: O Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Sim, porque desde 1º de janeiro de 2009 entrou em vigor no Brasil a nova grafia do português, definida pelo Acordo Ortográfico de 1990.

Oito países de língua portuguesa ratificaram o acordo. Foram eles: Angola, Brasil, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Moçambique, Portugal, São Tomé e Príncipe e Timor Leste.

O Brasil ratificou o acordo em 1995, implantou em 2009, estabelecendo um período de transição, e, finalmente, o torna obrigatório a partir de 2013. Isto quer dizer que “autoescola” ainda pode ser grafada como “auto-escola” sem que se constitua erro, até 2013.

O trema foi extinto (mas há exceções), algumas palavras perderam acentos e as regras do hífen mudaram. Agora é preciso reaprender a escrever do jeito novo. Ouvi muita gente lamentar a perda do trema. Muitos achavam certo charme usá-lo. No entanto poucos sabiam usá-lo. Terá a linguiça do nosso churrasco o mesmo sabor da antiga lingüiça? Pior o meu computador, que quando escrevo sem trema, teima em corrigir automaticamente, colocando o sinal.

O acordo é muito vasto, e é bom conhecê-lo na íntegra, para escrever melhor. Afinal, já o devemos seguir agora, e teremos mesmo que segui-lo obrigatoriamente em 2013, que já está em cima. Tire um tempinho, conheça e estude o Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa. Depois de bem estudado, veja se você passa pela bateria de testes.

Já que toquei no nome de Olavo Bilac, é bom lembrar quem foi ele. Além de poeta parnasiano, cronista, contista, conferencista e autor de livros didáticos, Bilac deixou também na imprensa do tempo do Império e dos primeiros anos da República vasta colaboração humorística e satírica, assinada com os mais variados pseudônimos, entre os quais os de Fantásio, Puck, Flamínio, Belial, Tartarin-Le Songeur, Otávio Vilar, etc., assinando, em outras vezes, o seu próprio nome. Nascido no Rio de Janeiro a 16 de dezembro de 1865 foi um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, em que ocupou a cadeira nº. 15, que tem Gonçalves Dias por patrono. No seu principal livro, "Poesias", incluiu Bilac alguns sonetos satíricos, sob o título de "Os Monstros". Escreveu livros em colaboração com Coelho Neto, Manuel Bonfim e Guimarães Passos, sendo que, com este último, o volume intitulado "Pimentões", de versos humorísticos.

Foi deste seu livro principal, Poesias (Livraria Francisco Alves - Rio de Janeiro, 1964), que extraí os versos do soneto abaixo, em sua pág. 262.

LÍNGUA PORTUGUESA
Olavo Bilac

Última flor do Lácio, inculta e bela,
És, a um tempo, esplendor e sepultura:
Ouro nativo, que na ganga impura
A bruta mina entre os cascalhos vela...

Amo-te assim, desconhecida e obscura.
Tuba de alto clangor, lira singela,
Que tens o trom e o silvo da procela,
E o arrolo da saudade e da ternura!

Amo o teu viço agreste e o teu aroma
De virgens selvas e de oceano largo!
Amo-te, ó rude e doloroso idioma,

em que da voz materna ouvi: "meu filho!",
E em que Camões chorou, no exílio amargo,
O gênio sem ventura e o amor sem brilho!

quinta-feira, 5 de maio de 2011

8 de março: - um dia internacional para as Mariazinhas


Convidaram-me a sugerir um nome de mulher, para ser homenageada na Assembleia Legislativa do Estado do Ceará, pela passagem do Dia Internacional da Mulher. Desculpe-me, Mariazinha, pensei em ti.
Pensei em ti porque me lembrei que súbito, da mente imunda daquela besta insensível, a gravidez precoce, indesejada, nem sequer pensada ou sabida, despencou-se sobre tua vida, fazendo inflar teu ventre, já dilatado de farinha e verminoses. Aos nove anos, nem chegaste a ouvir o chocalho da serpente que anuncia os perigos do mundo, e já fostes picada por ela, de forma irreversível, entrando definitivamente para a estatística oficial de dados do governo. Não te preocupes, lá teu nome não aparece, és apenas um número, um número falso, tão pequeno que nem preocupa a sociedade.
Mas há outro mundo, minha pequena, um mundo onde crianças de tua idade, ainda brincam de bonecas, e como o pequeno príncipe, ainda sonham plantar rosas no deserto. Mas aqui, nestas ruas pobres e desertas deste Ceará que conheces, onde de nenhuma mudança te falaram, não encontraste nenhuma ponte para o futuro, mas apenas as pontes para o abismo onde te encontras. Nenhum pequeno príncipe plantou, achou ou colheu rosa nenhuma. Somente tu e outras crianças pobres, foram plantadas entre as pedras toscas deste calçamento. És agora, semente e adubo. És rosa banhada no sangue de outras crianças pobres que se foram, vítimas de violências, como tu és agora. És uma rosa-bússola, poderás servir de rosa-rota para que pessoas de bem, te vejam como rosa-luz no fim do túnel, iniciando um processo de redenção de crianças como tu. Um dia, minha pequena, talvez já nem estejas mais aqui, serás rosa-ninho, serás uma rosa-canção, anunciando a outras meninas a rosa-liberdade, a rosa-amor, a rosa-lua, a rosa-utopia, a rosa-caminho.
Mas são irônicas as páginas desta vida. As mesmas pessoas que tem obrigação de legislar para ti, cuidar de ti, mas te viram as costas, querem na grande casa do povo, homenagear a mulher, pela passagem do seu dia internacional. És a mulher ideal para ser homenageada. Mulher-menina, menina-mãe, mãe abandonada, reúnes tudo para seres merecedora da homenagem. Representas as meninas, as mulheres, as mães desta América Latina abandonada, desta nossa Pátria Grande., que ainda morrem de parto, pneumonia, fome, diarreia. Representas as meninas, as mulheres, as mães da Mama África, morrendo das mesmas misérias, de malária, tifo, AIDS. Mas não serás a homenageada. Há mulheres brancas, ricas, perfumadas, com extensos currículos de obras e serviços prestados a ti, que estarão lá, em teu lugar, sobre tapetes vermelhos, entre champanhe e caviar, recebendo prêmios, homenagens e prometendo que continuarão a lutar por ti, nas mil frentes e Fóruns de Alguma Coisa, ou de Coisa Nenhuma, que criam para desviar o dinheiro público, de programas assistenciais que te pertencem. Doce ironia! Foi muito, sonhar com a tua presença nos salões luxuosos da Assembleia Legislativa, com tua face terrosa, teus braços finos, esta pasmaceira, fruto de mais de quinhentos anos de abandono e indigência. A maioria fingiu que não viu teu nome entre as candidatas.
Quanto tempo, meu Deus, vai-se passar ainda, até que esta sociedade entenda, que toda a violência que se abate hoje, sobre o Rio de Janeiro em chamas, deve-se ao abandono e falta de políticas públicas para a criança, em um processo que teve início há trinta, quarenta ou quinhentos anos atrás? Lembro-me do último ditador, na década de 80, contemplando do asfalto a favela da Rocinha, grasnando para a sua assessoria: “quando esta favela invadir o asfalto, não haverá canhão que a segure...” Triste profecia, que hoje se realiza. Quem sabe, estamos gerando hoje, em teu ventre, um futuro Raimundinho Beira-Mar? E seria tão fácil evitar. Evitar sem aborto, mas com políticas públicas.
Quanto tempo, meu Deus, vai-se passar ainda, até que possamos parar em um semáforo de Fortaleza, sem que se aproxime, minha pequena, uma menina como tu, grávida, ou com sua latinha de cola, mãos estendidas, a exigir esmolas, com um duro olhar de adulto sofrido?
E como é duro, pequena, saber que não és a única. Há pouco, outra como tu, passou por isto. Mais grave, na tua idade, ela que era portadora de uma síndrome qualquer, talvez nem mesmo diagnosticada, surda e muda, a boca torta, os braços saudosos da posição fetal, tentando falar de sua angústia, em sons afásicos, fazendo com que muitos olhassem para o outro lado, como se não a estivessem vendo, ela também amanheceu grávida, às vésperas de um dia internacional de qualquer coisa. Seu filho está aí. Foi parido na rua, numa lua nova, surgiu natimorto, destinado a morrer no primeiro ano de vida, mas de pura teimosia, sobreviveu. Sobreviveu contorcendo-se nos ataques epilépticos. Faminto. Crescendo para repetir no futuro a mesma terrível mímica do seu passado. Filho de um pai que não o assumiu, apesar do bom nível social, bom emprego, mas que numa noite qualquer, deslocou os ossos de uma criança esquálida e doente, para ter com ela um breve ato de prazer animal. E aí está ele, solto, beneficiado pela venda que a mãe justiça usa nos olhos, impedindo-a de ver as mazelas que assediam as meninas pobres.
Infelizmente, pequena, tu e ela, tiveram o azar de serem concebidas de sementes enfraquecidas por endemias e carências, em lares pobres, mesmo em uma nação rica e com potencial. E estás aí hoje, carregando pelas ruas, fora da escola, todas as avitaminoses, vermes intestinais, tuas crônicas dores de dentes, lutando por um prato sem proteínas, indigna de estares nas festas do legislativo.
No ano que vem, talvez compadecida, esta sociedade te convide. Aí já não poderás ir. Estará cuidando de teu rebento, febril, arrastando-se pelo chão de terra batida de teu barraco, disputando vagas com os insetos, sobre os próprios excrementos.
E por que luto por ti? O que posso fazer por ti, quando acima de mim, muito acima de mim, pairam forças satânicas, que tendo nas mãos o poder de fazer por ti, nada fazem? Quando muito acima desta forças, pairam outras maiores, cujo fragílimo equilíbrio, reside na sua própria força de destruição. Forças, que por excesso de tensão, podem desencadear um átomo, a qualquer instante, pondo um fim também precoce ao teu sofrimento, livrando-te do fim natural que tiveram teus antepassados, mortos por um nó nas tripas, uma barriga d’água e outras mazelas populares que disfarçam o câncer, a ruptura da hérnia, a úlcera gástrica, a cirrose hepática, que o SUS, o Saúde na Família não trataram. Mas deixarás tua filha, para seguir teus passos. Barrada nos salões nobres da casa do povo. Vendendo na beira da estrada, a pele frouxa e os seios caídos, para sustentar a prole. Gente sem história.
Talvez eu lute, e sei que não estou só, para que saibas de onde viestes, porque estás aqui, para onde vais. Para que tua vida não se acabe em vão, sem que os poderosos sequer lembrem-se de ti. Neste 8 de março, minha pequena, tu não estarás nas homenagens à mulher, nos salões da Assembleia Legislativa. Eu Também não. Estarei contigo, afagando teus cabelos, no chão do teu barraco, cobrindo-a com um plástico, para proteger-te da água da chuva, que teima em cair dentro da sala, ultrapassando o telhado de palhas. Estarei contigo, ninando-te para dormires, acariciando teu ventre que agasalha a vida. Parabéns mulher, hoje é teu dia.
Quimeras - 08/03/2003

segunda-feira, 2 de maio de 2011

Qual é a causa porque o teu milho não espiga?


Tenho um amigo, padre italiano, muito progressista, que depois de muitos anos radicado numa comunidade pobre de Fortaleza, o Conjunto Palmeiras, mudou-se para o Timor Leste onde reside há alguns anos. Neste mês de junho vivemos mais um ano sem o Pe. Chico Moser.

Perdemos no Ceará, um companheiro de muitas lutas. O único que tinha "peito" para me acompanhar nas incursões que eu fazia às pedreiras dos poderosos para flagramos a exploração da mão-de-obra infantil.

Mas aquele "povo baixinho amorenado" do Timor Leste ganhou um grande aliado em sua luta. Um aliado forte, radical, destemido que estará com eles para fazer espigar seu milho, florescer seu arroz, entender a causa do seu suor sem fim...

Vejam a poesia do relato que ele enviou de lá:

QUANDO O ARROZ FLORESCER...

"Qual é a causa porque o teu milho não espiga? Qual é a causa porque o teu arroz não floresce? Qual é a causa da tua fome? Qual è a causa do teu suor sem fim?"
(Kolele Mai Fco. Borges da Costa)

A resposta do poeta timorense , no poema acima , estava implícita: era o colonialismo. Ele mesmo morreu baleado no primeiro dia da invasão da Indonésia, 7 de dezembro de 1975. O mundo estava ocupado e distraído com a derrota no Vietnam. Estou finalmente em Timor Leste. Moro em Dili, a maior das cidades, quase 200.000 habitantes. Um belíssimo porto. Atrás as montanhas. Timor, terra ainda desconhecida à industria turística. É uma questão de tempo, porque tem belezas e cores para dar e mostrar.

Todo dia saio de manhã, cedinho. Voltei a estudar em tempos de aposentadoria. Mergulhei no estudo do Tètun, umas das 42 línguas. A juventude foi obrigada a aprender a língua do ocupante (o bahatsa). A política era apagar as línguas, destruir a resistência, "substituir" o povo timorense com as famosas "transferências" forcadas. Há dois anos, desde 20 de maio de 2002, o povo desta ilha resistente tenta subir a ladeira da justiça, da dignidade. 50% é juventude. Existem em Dili 7 pequenas universidades. Numa delas, que eu conheço, estudam 3.000 jovens todo dia. A cidade é mais parecida com um grande acampamento. Cidade de muitos "malai", assim os nativos chamam os estrangeiros. São padrões de vida diferentes.

Para os de fora, supermercados e mercadorias a preço de dólar. Os Timorenses, empobrecidos e estressados pela guerra, vivem, na maioria, abaixo do nível da pobreza. Sabe-se que o modelo ocidental, recolher dinheiro no mundo para pagar aqui os técnicos dos países ricos, tem custado demais. Os militares dos capacetes azuis da ONU estão retirando-se devagar porque ainda há perigos nas esquinas. Participei de uma jornada sobre saúde e pastoral da saúde, com gente de toda a ilha e foi surpresa agradável a qualidade dos debates e da reflexão.

Recuperar a saúde individual e coletiva é um desafio urgente. A cidade está renascendo lentamente. Impressiona a quantidade de prédios e construções carbonizadas, antigos hotéis, repartições públicas, inclusive a casa de dom Belo, o bispo Nobel da Paz, tudo ardeu durante 15 dias, quando as milícias e os militares indonésios se retiraram, assassinando, queimando e destruindo. O pesadelo e o horror permanecem no inconsciente.

Comissões "pela verdade e pela reconciliação" trabalham há 4 anos. Esse ano serão publicados os relatórios. Mas, os dois generais que comandaram as operações de extermínio, serão candidatos às eleições no dia 02 de julho próximo. Acompanhem! O povo cala, parece tímido, mas è porque ainda não confia. Pouco a pouco as estruturas e os serviços são reconstruídos.
Mais difícil é recompor a vida, as relações feridas.

Aqui, tudo se encontra. Todos os povos, ONGs, UM, Organizações trabalham. A queixa é grande em relação à distancia desses técnicos da vida real, humilde desse povo "baixinho, amorenado". Crianças e jovens, de uma beleza encantadora, sorriem largamente e cumprimentam. A Igreja Católica teve papel histórico grandioso na época da ocupação. É, porém, uma Igreja que não conheceu o concílio Vaticano II, Igreja Povo de Deus, comunidades de base. Há poder concentrado nas Congregações presentes.

Cuidam um pouco de si mesmas, não marcam presença ativa junto aos sofredores: constatação feita pelo novo Bispo de Dili, na Sagração no dia 02 de maio passado, diante de 20.000 pessoas em bonita celebração campal.
Há esperança, há confiança nas lideranças que foram, durante tanto tempo, à luta da independência. A natalidade é elevada. Nascem muitas crianças, mesmo em contextos de risco e fragilidade. São muitas tarefas ao mesmo tempo. Cuidar da vida "ferida como esta", na palavra do Zé Vicente.

Caminho pelas ruas, reconheço os sinais da realidade urbana, a lógica da exclusão aumentando: turmas de crianças pedindo esmola, perambulando em pequenos bandos, o lixo e os esgotos a céu aberto. A informação é pouca, os jornais começam a circular, um canal de TV, algumas rádios. Luz elétrica racionada. Isto na cidade porque na serra distante onde vivem antigas populações e onde trabalham duas equipes de irmãs brasileiras, existe um gerador parado por falta de combustível e as comunicações não existem, a não ser a rádio de emergência da policia.

O campo de trabalho é grande.
Penso por onde deve andar o caminho da missão. Penso no grão de mostarda que está crescendo, na força extraordinária desses enfraquecidos e encurvados sob o peso que carregam. Admiro algumas dezenas de pessoas que eu conheci (e quem sabe quantas mais?). Tecelãs e tecelões de um dia novo.

Ficou um povo de viúvas e órfãos, de deslocados e traumatizados. Mas é um povo que herdou o gosto da festa: cantam bonito, gostam de corais.
Nós, das comunidades brasileiras, temos belas experiências a contar, mas timorense capricha no canto, na liturgia, na dimensão da alegria. É um contrapeso importante.

Ligar missão e cura, contatos humanos frequentes, ver a possibilidade de estender pequenas redes de comunidades urbanas, como estações da Vida ou pontos de encontro. Caminho apressadamente pelas ruas, olho e gravo as pichações ainda intactas da guerra, em tètun, em português e em bahtsa: há um quê de ameaça nessas frases. Ninguém as apagou. Como os prédios, às centenas, chamuscados, queimados. Precisa de tempo. A memória das vitimas (mais de 200.000) está ainda viva nas mentes e corações. Uma amiga, antes de partir, na Messejana, me colocou em crise, dizendo: "Vale a pena ir tão longe"?

A resposta provisória é mais ou menos assim: "Talvez demorei demais".
Timor Leste, "Lorosa" (o Sol que levanta). É o primeiro país que o Sol vê, ao surgir, toda manhã . Outro dia me despedi da repórter de guerra Rosely Forganes, paulista, que escreveu "QUEIMADO, QUEIMADO, MAS AGORA NOSSO".

Vale a pena ler algo novo. Algo sempre está acontecendo, um pouco mais ao leste, para um leste mais distante.

Amanhã, em Dili.

Junho de 2004.