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sábado, 19 de abril de 2008

Chico Poeta

Chico Poeta era o meu pai. Natural de Ubajara, no Ceará, de onde saiu cedo para Fortaleza, para prosseguir os estudos no Colégio Militar. Foi daí para a Escola Preparatória de Cadetes, ainda em Fortaleza e depois para a Academia Militar do Realengo, no Rio de Janeiro, de onde saiu aspirante à oficial, na arma de infantaria, na turma de 1931. Oficial voltou a Fortaleza, onde serviu no QG da 10ª Região Militar, no 24° Batalhão de Caçadores e no Colégio Militar, de onde foi secretário.
Mas aqui, eu queria prender-me ao seu lado poético e romântico, pois até quero de vez em quando, postar uns poemas seus. Alguns de seus poemas, como "O Carreiro de Estremoz" recebeu música de José J. Carvalho, para canto orfeônico em quatro vozes. Também "Jangadas," escrito em 1927 foi musicado pelo maestro Euclydes da Silva Novo, com pauta para piano e canto. O mesmo maestro musicou seu poema "Canção de Iracema," de 1928, para canto orfeônico em quatro vozes.
Sua veia poética aflora em cada linha de seus trabalhos, onde objetos inanimados ganham vida, voz, alma lírica, como a sua. É o caso de "jangadas que interrogam", da "velha porta a gargalhar", "pedras que sonham indiferentes", ou ainda quando vê o Farol de Mucuripe, como humano, atribuindo-lhe coração e sentimentos.
Mesmo nos difíceis dias em que viveu as crises que nossa história registrou, não permitiu jamais que o seu lado "soldado" endurecesse o coração de poeta apaixonado
Do pequeno Chico Poeta que vendia versos aos colegas do Colégio Militar, em Fortaleza, por alguns trocados para o cinema, ao generalato, no ápice da carreira, nunca deixou de escrever, com muito amor e romantismo, mesmo nos piores dias, para o país ou para o seu coração.
A inspiração e a beleza que afloram em seus versos prendem para sempre os que o lêem pela vez primeira. De onde, de que espírito tão puro, vem tanta beleza? E onde está a beleza da solidão, do inconformismo, do arrependimento, da morte? Disse Anatole France, In Vie Literaire: "Creio que jamais conseguiremos saber, porque motivo uma coisa é bela."
Esta frase, embora vindo de um autorizado artista, não nos obriga a demorar na busca desta certeza. Será a beleza uma coisa objetiva, ou somente uma idéia pessoal, subjetiva? Não sei. O que me basta saber, - nisto não paira sombra de dúvida, - é que todos os corações que pulsam na terra sentem o apelo do belo.
Quando um artista, um gênio, perde toda sua força espiritual e sua alma decai, este ainda poderá assomar à borda do abismo e ser salvo se tiver preservado com ele este único bem: o senso de beleza.
Fui testemunha das inúmeras vezes em que ele ressurgiu exuberante e belo, dos muitos abismos em que teimavam atirá-lo. Inútil, êle retornava, paciente, desprendido, sábio, carinhoso e apaixonado, em busca da nunca esquecida beleza.
Aos que não o conheceram, está em tempo, seus poemas, refletem sua vida. Alternam perspectivas, arrependimentos, inconformismo, fatalidades, aflições, sempre exibindo o belo como alternativa.

Paulo Afonso, em Itaitinga, CE, 21/11/1998.

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